Livro: Vidas Fakes

 


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VIDAS 

FAKES

 

Fames magistra /
 A necessidade é mestra.




Essas são as histórias de Roberval Ébrio, um sobrevivente do mundo cão, narradas por ele mesmo...

O bar de família

    Perto de onde moro tinha um bar que o dono fazia questão de dizer que era "um bar de família". E é verdade, lá só tinha bêbado, corno e puta de família e, incrivelmente, a maioria era bem-sucedida, tinha muita grana e por mais louco que pareça, a maioria que ia lá era gente boa, descolada, mente aberta para assuntos gerais, menos sobre alguns aspectos da política da República dos Macunaímas, o País "No Future", como alguns mais críticos falavam.
    Nesse bar, quase todos se diziam "Conservadores e Cristãos". O que se dizia dono do bar, Zelão, às vezes ia à novena durante a semana e até à missa aos domingos, claro, isso quando ele não ficava no sábado até mais tarde com os amigos do fiado, tomando alguns litrões e "entupindo o nariz" no depósito das bebidas, ouvindo aquela música do Bezerra da Silva que diz: "tem Coca aí na geladeira, tem Coca aí na geladeira".
    Foi nesse Bar que conheci Helga, Lídia e Iracema, mulheres deliciosamente loucas. Não foi exatamente no bar, mas enquanto estava no bar vendo o celular, as ditas cujas redes umbrais sociais, jogando papo para o ar com os bêbados de plantão.


Um pouco do passado

    É, o mundo mudou, as pessoas mudaram, não tanto, mas mudaram em alguns aspectos. Antigamente, digo, há uns vinte anos atrás, para tentar conquistar uma mulher, pelo menos no Sul da República dos Macunaímas, não tinha bar com mulher normal, só zonão. E para achar mulher que não fosse da lida, uma mulher que não precisasse pagar, o sujeito tinha que ir à selva humana, aos bailes, festas, danceterias, saraus, matinês, muquifos em geral e encher o caneco, dançar, pagar montes de bebidas, lanches e o diabo a quatro, o que no final das contas, saía mais caro do que ir no zonão, e mesmo assim quase sempre, no final, só achava baranga, canhão, bicho feio. A turma brincava na época dizendo: "e aí Roberval! Ontem à noite pensei que você estava indo assaltar um banco. E eu ainda perguntava, mas como assim, Índio Véio? E o tosco tagarela respondia: como assim? É que eu te vi com um canhão que botava até Satanás para correr!!!". E riam. E antes que algum mimizento chore as pitangas, não há nenhuma intenção de maldade aqui em falar da mulher feia, é apenas um relato histórico do tempo passado, onde mulher feia era mulher feia, mulher bonita era mulher bonita, mulher meia boca era mulher meia boca e os homens em geral eram idiotas, bêbados, burros e cornos. Hoje em dia, falar que mulher feia é mulher feia parece um pecado mortal. Feio é feio e ponto final, seja, mulher, homem ou o diabo a quatro. E perceba que não havia preconceito com mulher feia naquela época, afinal, todo mundo pegava mulher feia.
    Contudo, não era mole não. A moçada dos dias atuais, jamais saberá o que é encher a cara, entrar na porrada com outros bêbados, catar qualquer 'Tribufu' que cruzar na sua frente e ainda ter que andar uns vinte quilômetros até a casa da Visagem, lá onde Judas perdeu as botas, muitas vezes debaixo de chuva, não poder entrar porque ela se fazia de virgem, séria, mulher para casar e dizia que te achava lindo, maravilhoso, também para casar e que, por isso, as coisas sérias não devem ser apressadas e toda aquela ladainha de sempre, e assim, escapulir do 'fight', não te dar nem um copo d´água e você ter que se contentar apenas com uma sarrada ou quando muito uma mãozinha tímida no 'Geromel'. Não tenho dúvida que se pegassem a rapaziada "sensível" de hoje em dia, os enfiasse numa máquina do tempo e os jogasse na época da nossa juventude, eles nunca mais se recuperariam do trauma.
    Contudo, hoje em dia é tudo mais sofisticado, e com as redes umbrais sociais, aplicativos idiotizantes e tudo mais, arranjar mulher é tão fácil quanto dar Golpe de Estado, é a coisa mais fácil do mundo, principalmente, porque homens de verdade, machos 'in natura', sem ofensa, andam em falta no mercado. Diga-se de passagem, é importante dizer que, nesse mundo de idiotização, gadização, desumanização, vidas fakes, frescuras, bundamolice e malemolência, onde quase tudo vira motivo pra cadeia, uma das coisas mais difíceis é Ser Macho. Hoje em dia, máxima data vênia, Ser Macho 'In Natura' é tão perigoso quanto era blasfemar na Idade Média. Por isso, atualmente, há poucos machos de verdade expostos por aí. Aliás, Macho de verdade não fica se arreganhando feito gaita. Logo, por mais que digam que não, as mulheres de hoje em dia, carentes de machos de verdade, acreditam em qualquer papo bem elaborado. Basta fingir bem e ressaltar sempre que são elas que mandam, fingir que concorda com certos aspectos do feminismo e até mesmo dar uma esquerdada, que quase tudo dá certo.
    Sim, com o empoderamento feminino e a ascensão social da mulher, o Homem, Macho, se obrigou a ser mais inteligente e por mais chucro e imbecil que seja, teve que aprender novas linguagens, novos códigos, novos jeitos, novos macetes para se sobressair, mas sem perder a essência de Macho da espécie. A gurizada de hoje em dia ou é 'escravoceta', sensíveis critaiszinhos, criados na base de Nutella que comem um vagão de bosta por uma garota ou vivem chorando atrás das meninas que preferem caras mais velhos ou mulheres (inclusive mais velhas), ou então, nem querem saber 'do risco', tamanha é a castração social. Também tem o fato da Pandemia do "Vírus do Morcego Chinês" ter represado o tesão da mulherada, de certa maneira.
    De fato, após terem ficado quase dois anos trancafiadas em casa, em quarentena, em círculos limitados, muitas mulheres, principalmente as casadas, viraram verdadeiras bolas de fogo e tem que ter água na mangueira para apagar tantos incêndios.

A emancipação das mulheres

Não há nenhuma dúvida, entre os que usam sua massa cinzenta, que as Mulheres venceram, são livres, independentes e estão reconfigurando esse mundo. Claro, espera-se que elas não se estraguem e se percam no meio do caminho como os Homens. De fato, sobre a vitória das mulheres, só os homens tolos não se mancaram ainda. Reconhecer a vitória das Mulheres não diminui em nada o Homem com H Maiúsculo, muito pelo contrário, uma Mulher forte, bem-sucedida, independente, verdadeiramente empoderada, inspira o Homem e o estimula a se esforçar mais e ir além, e isso, ao longo do tempo, faz com que a humanidade seja melhor, ou pelo menos, menos pior. Somente o homem com h minúsculo, complexado, tosco, impotente, problematiza, reclama, esperneia. E como ainda se vê em alguns lugares pelo Planeta, os homens com h minúsculo, idiotas, fracos de mente, coração e alma, tentam, inutilmente, calar a voz das Mulheres e, mais inutilmente ainda, tentam parar a marcha do tempo e sabotar os avanços civilizatórios, que são lentos mas estão aí, muito, graças as Mulheres com M maiúsculo. É claro que há mais explicações para a "liberação das mulheres", como as mudanças do mundo, que de uns dez anos para cá, fizeram com que a maioria das mulheres, por mérito pessoal delas, esforço próprio, é preciso reconhecer isso, conquistassem melhores posições na sociedade, estudando, se formando, se especializando, se empoderando mais e mais, e isso as tornou mais autônomas, independentes, livres, donas do próprio nariz, mais parecidas com os homens. Inclusive, algumas mulheres, empurradas pelas imposições dessa nova sociedade fake, para o abismo do "empoderamento a qualquer custo", se tornaram iguais ou até piores que o homem do tipo dinheirista, safado, putanheiro, canalha e cafajeste. Sim, as mulheres como coletividade, venceram. Mas a realidade é que tal vitória só se dá por causa das Mulheres com M maiúsculo, que são a minoria. A maioria das mulheres, infelizmente, são mulheres de m minúsculo, inseguras, paranoicas, infantis, extremamente vingativas e dão mais que chuchu em cerca, para qualquer um, ou uma. E nessa pegada de 'querer parecer homem', a mulher com m minúsculo quebra a cara feio, muito pior que o homem em geral.
    A única coisa que ainda distingue a mulher cafajeste, que é o pior tipo de mulher com m minúsculo, do homem cafajeste, é que a mulher que se acha super poderosa, que se tornou igual ou pior ao homem cafajeste, por mais que queira passar a imagem de mulher cafajeste, destemida, 'fodidona', até fria e sem coração, ainda sim, ela tem uma tremenda facilidade para cair nas arapucas do coração e, por isso, continua a gostar de sofrer. O fato é que contra a Natureza não há salvação, ou seja, não dá para ir contra a Natureza, por mais que se tente é inútil, pois cedo ou tarde, a Natureza, ainda que de revesgueio, se impõe e bota todo mundo de quatro, principalmente, as mulheres.
    Contudo, porém, os novos tempos e isso que chamam de "avanço civilizatório" fez com que as mulheres de um modo geral se tornassem mais donas de si mesmas e presentes em toda a sociedade, inclusive indo à putaria e também aos bares.
    Antigamente, se você visse uma mulher sozinha bebendo num bar, todo mundo do bar já pensava que ela era uma prostituta e os mais imbecis já caiam em cima feito urubu em carniça. E, por mais louco que pareça, há lugares hoje em dia que ainda são assim, o que exige cautela redobrada da mulher, desde que apenas beber seja a sua real intenção.  Com efeito, o fato é que hoje em dia, as mulheres estão em toda a parte, principalmente, onde só iam homens, como nos bares. Alguns maridos até levam suas esposas junto no bar, para a alegria dos olhos de secar pimenteira dos tarados e bêbados de plantão.
    É por isso que bares como o do Zelão, bar de família, são os mais frequentados por mulheres, com ou sem maridos. Apesar de mesmo ali ainda ter os 'bronheiros' de plantão, há uma espécie de código moral, de ordem e de lei do tipo: "se 'louquiar', mexer com a mulher do outro ou mexer com uma mulher, seja quem for ela, se sozinha ou acompanhada de amigas, sem que ela dê bola, a porrada canta no lombo do sujeito que inclusive acaba banido do local". Num bar assim, de família, vale quase tudo, menos putaria e patifaria explícitas e, de certa forma, prevalece o dito: "Respeite e será respeitado. Entra no respeito e fica na moral. Não respeitou? Vai pro pau!".

Seu Djair

    Às vezes, Zelão, que ainda era um jovem de trinta anos, ficava na gandaia até de madrugada e, por isso, deixava a abertura do bar a cargo do seu Pai, o bom velho Djair. Todo boêmio ou bêbado que se preze, sabe que não convém fazer amizade com dono de bar porque depois de um tempo, eles pegam confiança e acabam te roubando na conta, sobretudo, se você passar o dia bebendo ou ter conta pra pagar depois. Mas, no caso do bar do Zelão, apenas o Zelão dava uma roubadinha vez ou outra, de leve, para não afugentar os clientes. Muitos dos frequentadores do bar já eram clientes antigos, eram ricos ou bem de vida, bem empregados, aposentados, funcionários públicos, professores, policiais, bancários, advogados, jornalistas, políticos, boêmios em geral, ou seja, bêbados com grana, que até sabiam que eram roubados mas relevavam porque, como dito, era um bar de família e todos gostavam do ambiente.
    Mas, seu Djair, que no final das contas era o verdadeiro dono do bar, ele nunca surrupiou ninguém, ele era do sistema antigo, sério, anotava tudo no caderninho e era certo até os centavos com todo mundo.
    Tinha uma época que eu gostava de beber desde cedo e, por isso, gostava muito de ir ao bar de manhã porque sabia que o seu Djair estava lá e era o único momento em que se podia ter uma conversa franca entre homens de verdade, sobre todo tipo de assunto, inclusive as patifarias da politicalha da República dos Macunaímas.
    Como em todo bar, sempre chega um moralista para apoquentar. Certo dia, era umas nove da manhã, eu estava no final da primeira garrafa de cerveja, quando chegou um desses velhos santarrões barrigudos e bigodudos da sociedade fake. Seu Djair disse-lhe bom dia, ele respondeu, pediu um café e um bolinho de carne, que era marca registrada da casa, e ficou por ali moscando no balcão.
    Seu Djair mesmo é quem fazia o bolinho amassando carne moída com temperos especiais enquanto coçava o saco por cima da calça. Porém, todos adoravam aquele bolinho e, ademais, já diz o ditado: "quem vê a comida pronta no prato no restaurante, não se preocupa com o que se passa na cozinha". No caso do bar do Seu Djair que todos chamam de bar do Zelão, "quem vê os bolinhos brilhando na estufa, não liga nem um pouco sobre como eles são feitos". Certo dia, seu Djair me confessou, com a maior naturalidade, que para economizar sacolas plásticas do supermercado, ele resolveu não juntar mais as bostas dos cachorros e decidiu jogá-las na horta de onde tirava a cebolinha e a salsinha que compunham o ingrediente do reverenciado bolinho. "É tudo átomo, tudo vira adubo, né?", dizia o bom velho amigo.
    E papo vai, papo vem, seu Djair me perguntou: vai mais uma Robe? E eu redargui de imediato: opa, com certeza! Mas nisso, o espírito de porco ao lado, logo soltou a já manjada baboseira de moralista santarrão: Cedo ein?! Olhei para aquela cara de bosta que parecia ter uma andorinha na boca, apenas ri de soslaio e entornei o copo com gosto, tornando a enchê-lo novamente.
    Seu Djair vendo a cena toda e sendo meu bom amigo, disse: Sabe, Robe, um dia eu estava na praia com a minha mulher e resolvi ir num bar perto da casa tomar uma cerveja. Era umas 8:30 da manhã, de uma Quinta-feira. Cheguei lá, sentamos à mesa do lado de fora e destampamos aquela cerveja gelada, linda de se ver e começamos a beber. Não deu meia hora, passou um vizinho do outro lado da rua e disse: cedo ein seu Djair! Pois eu levantei e disse ao sujeito assim: viu, vizinho, passe lá em casa depois, fazendo o favor! E o cara: por que seu Djair? Lhe respondi: pra pegar os boletos e pagar as minhas contas. Depois que você pagar as minhas contas, poderá me encher o saco tranquilamente, beleza? E o cara saiu resmungando. E ria o seu Djair e eu ria com ele. E enquanto riamos, o espírito de porco ao lado, engoliu o café com o bolinho rápido, pagou e vazou pro ponto de ônibus. Esse era o seu Djair, um cara de verdade, amigo dos amigos.

Montanha-russa

    A nossa vida nessa Terra insana é como uma Montanha-russa, só que não pedimos para sermos colocados na porra da Montanha-russa. Mesmo assim, estamos nela, grudados no carrinho. Ela começa devagar, pega velocidade, vira para todo lado, fica de ponta-cabeça, e quando parece que todo mundo vai ser ejetado e destroçado, ela quase para mas volta a correr mais rápido, virar mais, passar por loopings e após subir para valer, ela então começa a descer. E após descer rapidamente ela para totalmente. Então, você desce do carrinho desejando nunca mais voltar e enquanto vai indo embora meio atordoado, vê outros combalidos, vomitando, mas também vê outros querendo dar mais uma volta. De fato, cada um tem um jeito de passar pela Montanha-russa da vida, uns em silêncio, outros sérios, alguns rindo e fazendo piadas, outros não ligando para nada e apenas curtindo o momento, alguns morrendo de medo, outros gritando, se cagando e vomitando. Eu bebo.
    Teve época em que a vida era mais insuportável e eu bebia destilado, pinga, tudo que tivesse de forte, bem cedo, a hora que acordasse, não importava se era seis da manhã, dez da manhã, meio dia. Mas, também teve uma época, só uma, em que fiquei mais de um ano sem beber nada de álcool, sem comer carne e até mesmo sem praticar a grande arte do 'fura couro', achando que iria encontrar um Deus diferente de tudo que já me pregaram, ou evoluir ao ponto de me tornar um Ser mega iluminado ou encontrar 'A Paz Interior'. Fiz parte até de centro espírita Kardecista, li tudo que é livro, participei de grupos de estudos, tomei passes, trabalhei em asilos de velhinhas e até achei que vi gente morta zanzando por aí, mas no final, percebi o quanto tudo aquilo era ridículo e me tornei outra vez a 'ovelha negra' que sempre fui e, então, 'voltei a programação normal', ou seja, voltei a beber, a comer carne e a praticar a velha arte do 'nhéco nhéco'.
    Confesso que, após esse ano de viagem na maionese, sobretudo, após o primeiro gole de cerveja, me senti mais vivo do que nunca! Hoje em dia, no auge dos melhores anos, quase nos cinquenta, bebo moderadamente, fumo de vez em quando, embora odeie o fedor do cigarro e vivo os dias assim, mais ou menos de boas, entre vinhos, livros, a arte de 'flóp-flóp' e cerveja. Uísque ou qualquer outro destilado mais forte só de vez em quando, quando desejo sair um pouco do normal, muito embora eu odeie sair do normal porque acabo ficando muito normal.

Helga

    Há uns oito anos atrás, portanto, sou cliente de longa data do bar, conheci Helga. Não foi exatamente no bar, mas eu estava no bar quando aquela ruiva desceu do ônibus com um traseiro que parecia a Verônica, a loira do Armazém da Esquina. É importante contar um segredo aqui, quando você conhece alguém não é no lugar em que você está, mas o lugar em que a pessoa está. Eu conheci Helga pelo seu traseiro após ela descer do busão, ali naquele tempo/espaço dela, embora ela só fosse me conhecer alguns minutos no futuro no meu tempo/espaço, de fato. Helga, que parecia ter uns 25 anos, tinha um traseiro de Verônica que tinha 43 mas que parecia ter 18.
    Verônica era ‘a Vê do Armazém da esquina’ e tinha um traseirão tão belo e convidativo que quase todos os bêbados e tarados da cidade iam até lá no armazém comprar alguma coisa, só para ver de perto a potência da mulher. Verônica era casada com o corno perfeito, aquele sujeito bom de bolso, banana, com várias propriedades, carros, ou seja, bem-sucedido financeiramente e bem tapado, do tipo que não vê nada ou finge que nada vê. Certa vez um amigo de boteco me confessou que foi fazer uma entrega na casa de Verônica, uma verdadeira mansão, e ela, como uma bela jovem senhora 'milf-maníaca' de quase 43, resolveu se engraçar e fazer-lhe 'um agrado rápido' na cozinha. Segundo ele, ela era incontrolável e a menor oportunidade que tivesse já ia pegando, baixando as calças do sujeito e fazendo aquilo que todo homem gosta, mas muitíssimo bem feito. A maioria das mulheres não sabem fazer tal arte com perícia e precisão, por isso quando um homem encontra uma mulher que gosta da coisa e sabe fazer bem feito é como acertar na loteria e, acredito, que também vale para as mulheres quando encontram um macho que sabe fazer bem feito. Verônica, a milf-maníaca, sempre fazia questão de pedir sigilo, discrição, porque dizia amar o cornão mas não tinha o que fazer em relação ao seu tesão incontrolável, quase selvagem. Dizia o amigo de boteco: "depois de bater uma bela bronha e tomar a 'seiva' toda como se tomasse água da mangueira e sorrir loucamente, quase que transfigurada, ela mudou da água pro vinho e como se nada tivesse acontecido, foi ao armazém pegar a grana da entrega e, então, atrás do corno, ela sorria como toda mulher que trai, sem mostrar os dentes, sem demonstrar um pingo de safadeza, quase séria, como uma beata acima de qualquer suspeita". "Ela me disse que sempre foi assim, desde menina, bem louca e que, mesmo tendo casado cedo, aos 17, sempre fez o que queria com quem queria, no sigilo, claro, o tipo de sigilo que a cidade toda sabe, menos o cornão", asseverou o colega de boteco.
    De fato, a mente de toda mulher é um mistério, mas a mente de algumas mulheres é uma galáxia de mistérios. Só um Homem verdadeiramente louco é capaz de se conectar à mente de algumas mulheres. E tal como Verônica, Helga, a ruiva, tinha uma potência traseira de deixar qualquer um desnorteado, até mesmo algumas gurias lésbicas, de grelo duro, que iam no bar de vez em quando, ficavam babando em Helga. Contudo, toda ruiva, não se sabe o porquê, é mais louca que várias loucas juntas, só que não demonstra isso, não de cara.
    Naquele dia fatídico, há alguns anos atrás, ela desceu do busão, entrou no bar, pediu uma cerveja e sentou numa mesa perto da máquina de Jukebox. Parecia a mulher mais insanamente feliz que já se viu com um litrão e um copo cheio de cerveja. Zelão que era sempre malandro, se mandou furtivamente para o quarto da sinuca e Helga, passado uns dois minutos, foi atrás. Pediu uma ficha e ficou jogando sozinha enquanto Zelão disfarçava e fingia que arrumava as caixas vazias de cerveja. Não deu cinco minutos, os dois já estavam se agarrando. Não tem nada mais tragicômico que a pegação com pressa e com medo de serem pegos no flagra. Pega daqui, pega dali, beija daqui, beija de lá, aperta os seios daqui, sarra de lá, mas nada mais que isso. Zelão, que ia até em novenas e às missas aos domingos, era casado com uma policial mas sequer esquentava a cabeça.
    Contudo, para que não ficasse 'meio esquisito', ele pedia para a galera ir jogar sinuca, para disfarçar caso a esposa aparecesse de sopetão no bar e não tivesse como desconfiar, afinal, eram outros caras que estavam com a Helga. E nesse dia, por acaso, não sei o que me deu na cabeça, resolvi ir no quarto da sinuca também. Lá, também tinha uma máquina caça-níquel engana trouxa e todo mundo arriscava alguns dinheiros achando que ganhariam alguma coisa. Em toda parte, sempre existirão idiotas achando que ganharão rios de dinheiro apostando alguns trocados.
    Após a bolinação, enquanto Helga conversava com Zelão e outros caras, eu me sentei numa banqueta e fiquei vendo o dito cujo celular e batendo papo com o bando de loucos pervertidos, todos malucos para pegar a Helga e a Helga maluca para dar para alguém ou para todos juntos. Era o que parecia. Nisso, a corna do Zelão chegou e claro, o malandro se mandou para o balcão, como se nada estivesse acontecendo no mundo. E lá ficamos Helga, alguns bêbados de plantão e eu. Helga não dava bola para os malucos e um a um eles foram saindo, restando apenas o único louco que poderia se conectar com aquela mente ruiva, depravada e perigosa.
    Então, enquanto andava em torno da mesa e jogava sozinha, empinando aquele mega traseiro de Verônica, ela começou a puxar conversa, o mesmo papo de puta de sempre. Começa com um assunto qualquer, depois passa para uma história triste, avança para uma distração e por fim acaba em fodeção. Quando menos percebi já estava de pé bebendo e logo jogando sinuca com a ruiva louca. Após uma meia hora de papo mole, insinuações, esfregadas indiretas entre a mesa, como diferente que era, ela começou com um papo de Programação Neurolinguística, dizendo ter estudado e lido vários livros sobre o assunto e que, por isso, poderia ter o homem que quisesse mas que nunca tinha visto um homem como eu, isto é, que não babava, ou pelo menos não demonstrava que babava pelo seu traseiro de Verônica, pelos seios fartos à mostra, pela boca com um batom vermelho vivo e seu jeito safado mas discreto de ser.
    Inegável, ela parecia esperta, tinha uma energia e tanto e sabia conversar. Podem acreditar, por mais impossível que pareça, o que muitos homens mais desejam nesse mundo, nem que seja só por um breve momento, é uma mulher inteligente, mas safada, safada, mas inteligente, que saiba o valor de uma boa conversa, sobretudo, o valor da discrição que, para muitos, é o que gera confiança e credibilidade. Como disse antes, um Homem de verdade, Macho, não fica se arreganhando feito arroz de festa, evita chamar atenção e preza por uma boa relação 'sui generis', única em si mesma, particular, singular, bela em si mesma. Helga não era nenhuma musa inspiradora mas a mim inspirava alguns pensamentos e imaginações que há tempos não mais havia cogitado.
    Helga:  Você não é como os outros.
    Eu, Robe: É? E como seria isso? Não ser como os outros?
    Helga, que usava óculos, sorria de lado e com a voz bem calma, mas firme, sensual, quase sussurrando, com a postura de uma louca que pretende lhe dar uma facada, roubar a sua carteira e ainda falar para a polícia que foi você quem a atacou, dizia: Sei lá, diferente, você olha nos meus olhos, não fica babando em mim como os outros caras, demonstra interesse mas não escancara, não fica me olhando como um tarado embora pareça, lá no fundo, muito disfarçadamente, querer fazer as coisas mais sacanas comigo.
    Eu: Caramba, você me pegou!
    Percebendo a minha ironia, Helga finge ter ficado brava: Deixa pra lá. Acho que seria legal apenas. Esquece.
    Peço outro litrão, Zelão vem trazer, já livre da esposa, pensa em retomar o rala e sarra com Helga, mas vendo que o bar vai movimentando no balcão, volta para atender os bêbados recém-chegados. Então, pego o litrão, encho meu copo, me aproximo de Helga que está encostada na parece segurando o taco, sinto seu cheiro de puta, inconfundível, perfume barato e cheiro de sexo. Encho seu copo. Com olhar de mulher que já está toda molhada lá embaixo, ela beija meu pescoço suavemente. Olho para ela com aquele velho olhar de conquistador barato, tomo outro gole e volto à mesa dar a minha tacada final. Bola oito no canto. Ela parece estranhamente excitada mas ao mesmo tempo ansiosa. Acende um cigarro, fuma rapidamente, senta na mesa e fica falando sobre seu 'conhecimento' de neurolinguística, fazendo parecer que perdeu todo o interesse. Então se levanta da mesa de sinuca, vai até à bancada, sonda a frente do bar, vê que estão todos ocupados ouvindo música e falando alto, saca um saquinho do bolso, joga na bancada duas, três pedrinhas brancas como o açúcar, as quebra, faz duas carreiras com o cartão do SUS, pede uma nota, lhe dou uma de vinte, ela enrola e manda brasa, cheirando até soltar um gritinho: uhhh! Aí me passa o canudo com a nota de vinte e diz: vai nessa? Respondo: por que não? Mando bala e inspiro com força: uau!!! Cacete! Essa foi de lascar!!! Helga sorri e volta para a janela do corredor para fumar mais um. Bebo mais uns dois goles de imediato, sinto a coisa subir, o coração bater mais rápido e mais forte. Ela bebe rápido também. Um, dois, três, quatro copos, mais um litrão. Zelão traz e se manda cuidar dos pinguços no balcão. Helga faz mais duas carreiras, pá e pá, a coisa vai ficando mais louca. Ela encosta na parede de novo, aí nos atracamos, beijos ardentes, pega daqui, pega dali, mas sem nenhuma preocupação de sermos pegos no flagra. Ela mete a mão por cima da minha calça, eu enfio a mão dentro da calça dela, enfiando o dedo até sentir a máquina de destruir casamentos, molhadíssima. Então, num ímpeto, ela pega por dentro de minha calça, solta o zíper e faz, maravilhosamente bem, aquilo que tem de ser feito para deixar em ponto de bala, então a viro de frente para a parede, e ali, de pé mesmo, vai e vem, rápido, forte, mais rápido, pegando daqui e dali, segurando forte sua belíssima cintura, puxando seu cabelo ruivo comprido, ouvindo seus gemidos baixos, com os bêbados falando alto lá na frente do bar, com a música, Bad Moon Rising, do Creedence, tocando na Jukebox, com a chuva caindo naquela tarde insana...numa explosão de energia, Bum! O momento mais breve e mais esplêndido da existência! Aquele momento que faz você se sentir vivo de verdade e com vontade de viver uns trezentos anos! Os dois juntos, ao mesmo tempo! Puta que pariu! Que coisa boa, o momento 'sui generis dos momentos sui generis', único de fato, singular de verdade e que faz a vida nesse mundo cão parecer muito mais que suportável, extraordinária!      
    De fato, as coisas mais deliciosas da vida, ocorrem de maneira relâmpago, sem nenhum plano, sem esperar, sem meias palavras, sem pensar duas vezes, no melhor do "vá e faça! Vá e viva!".
    Helga tirou uns guardanapos, limpou a coisa toda por cima, subiu a calça novamente e foi fumar na janela novamente e beber, sorrindo, insanamente satisfeita. Eu peguei a camisinha, a enrolei também num guardanapo e a deixei no bolso para jogar da moto em movimento como que me livrando da prova de um crime e claro, para não complicar a vida do Zelão, afinal, vai que a mulher dele acha a coisa na lixeira ou entope o vaso e volta o troço? Sim, eu penso em tudo, ou em quase tudo. Ato contínuo, tomamos mais um litrão, falamos umas bobagens como se nos conhecêssemos há tempos, uns caras chegaram pra jogar sinuca, saímos do quarto. Helga sentou na mesa de novo e ficou de papo com o Zelão. Paguei minha conta, subi na moto e vazei, me mandei. Helga ficou lá, olhando à distância, enquanto se alugava com o Zelão e outros caras, no bar de família.    



Historinha triste

    Toda puta tem uma historinha triste. Ao final desse capítulo vocês entenderão o que estou asseverando aqui. Antes, preciso esclarecer que não sou moralista, graças a Deus! A Moral é mais uma invenção dos endinheirados do mundo para controlar os não-endinheirados e miseráveis em geral enquanto deitam e rolam na devassidão, em zonões de luxo, bem distante dos olhos do povão. Ademais, não tenho absolutamente nada contra as putas, afinal, esse País no qual suportamos a vida na sociedade fake, a República dos Macunaímas, é uma putaria do início ao fim e, portanto, seria ridículo a qualquer um querer pagar de moralista, muito embora haja uma grande quantidade de corno e puta, principalmente na alta sociedade da República dos Macunaímas, onde muitos se auto-declaram "patriotas, gente de bem, de Deus e de família", se achando cheios de moral. Contudo, penso que não se pode confundir as verdadeiras profissionais do sexo, prostitutas de profissão, aquelas que ganham a vida com o suor de seus corpos, e que portanto, são muito mais dignas que os políticos, com a puta barata, a 'poser', a desonesta, picareta, farsante, aquela que vive querendo dar golpe em todo mundo, que se acha esperta mas que no fim não passa de só mais uma Maria-ninguém da vida que, inclusive, queima o filme das verdadeiras profissionais do sexo e é detestada por elas. Com efeito, também penso que não se pode confundir, de maneira alguma, a mulher viciada em sexo, tarada por sexo, ninfomaníaca, milf-maníaca, com a puta barata que nem sexo sabe fazer direito mas se auto-proclama expert no assunto. Portanto, ao me referir a puta aqui, estou me referindo a aquele tipo de mulher picareta que além de bandida-mané, ou seja, que nem malandra consegue ser, é ruim de cama. Vale lembrar que Bezerra da Silva já dizia que 'malandro é malandro, mané é mané', e isso também vale para a mulher que se acha esperta mas é como o homem burro, ou seja, mané. Claro, assim como há homens burros inofensivos e homens burros perigosos, também existem mulheres burras inofensivas e mulheres burras perigosíssimas, talvez, muito mais perigosas que os homens burros.
    Esclarecido isso, seguimos. Depois dos eventos narrados anteriormente, vi Helga umas duas ou três vezes e na última vez que a vi, a levei para o cafofo e após uma sessão de doideira e sexo alucinado, entre cigarros, doses de uísque e cervejas, ela me contou que estava planejando se juntar com um velho rico, um tal de Alfonso.
    Disse-lhe: Sorte do Alfonso!
    Helga: Ou azar! Ele até que é bem divertido, de bem com a vida.
    Eu: Então, você está esperando o que? Por que ainda não capturou essa mosca na sua teia?
    Helga: Não sei, dinheiro é bom, é ótimo na verdade, ter tudo do bom e do melhor é melhor ainda. Mas não sei o que acontece comigo, uma hora 'tô' afim de mergulhar de cabeça e depenar o frango gordo sem dó, nem piedade, até o último centavo, mas logo em seguida me bate uma ‘deprê’ e já não tenho mais tesão de fazer nada disso, me sinto até meio lixo por querer fazer isso com o velho ou com qualquer outro.
    Eu: A consciência é uma merda, não é mesmo? Por isso que eu sempre bebi pra caralho, para não ouvir 'o anjinho' do lado do ouvido, dentro da cabeça, no fundo da Consciência, me amolando. Com o passar dos anos, em meio a tanta merda nesse mundo, após caminhões de bebidas, entre tristezas, solidões, fodeções, morte e renascimento em vida, a dita 'Voz da Consciência' foi ficando mais baixa, até que de repente sumiu. Incrivelmente, não me tornei um psicopata ou um monstro por causa disso.
    Helga: Então a sua 'Voz da Consciência' não sumiu totalmente.    
    Eu: Será?
    Helga, rindo enquanto fumava: Me parece que sim! Você só a deixou louca, como você!  
    Eu: Pode ser. Foda-se...
    Helga: Quanto a mim, já tentei matar essa dita 'Voz da Consciência', mas não consigo, talvez, a única forma é me matando. Já pensei fazer isso, várias vezes, até fui à beira do viaduto me jogar, mas na 'Hora H', a porra do medo do 'depois da morte'. Não deu.
    Eu: Muitos dizem que tem medo da morte, mas na verdade ninguém tem medo da morte, mesmo porque quando a morte chega, na maioria das vezes, excetuando os moribundos, enfermos, nem dá tempo de pensar nela, logo nem dá tempo de ter medo. Todo mundo ou quase todo mundo tem medo mesmo é do dito 'depois da morte'. Uns dizem que morreu, acabou, game over, já era, um abraço pro gaiteiro. Outros acreditam que a porra toda continua, Céu, Inferno, Purgatório, Umbral, Colônias Espirituais, ou vagar eternamente entre esse e o outro mundo, enlouquecido. A mim me parece tudo uma grande baboseira. Quer dizer, diante da imensidão cósmica, certamente deve existir muito mais do que podemos imaginar mas dizer exatamente como é a porra toda, é algo tremendamente ridículo. Penso firmemente que após morrermos, seguimos em frente, seja vagando por aqui ou se mandando para o outro lado de fato, mas saber com exatidão, repito, sobre como a coisa será lá do outro lado? Penso que não tem como saber! Entende? Por isso que penso que todo mundo que diz que 'sabe como é a coisa do outro lado', mente que nem sente.
    Helga: Pode ser. Penso que existe algo mais também. E se existir um inferno ou coisa parecida, espero que todos os filhos da puta que me sacanearam nessa vida desde pequena, estejam lá quando eu me for para lá.         
Eu: Por que acha que você vai para o inferno, se acaso existir um?
    Helga, sorrindo enquanto bebe um trago de Conhaque: Pelo óbvio, sou puta, pecadora, já ferrei muita gente, embora ninguém dê a mínima para as coisas boas que já fiz.
    Eu: Vai começar a sessão de drama?
    Helga ri: Seu idiota!
    Rio junto e lhe digo: Não vá começar a chorar ou subir no telhado para se matar ein?
    Helga sorrindo: Tosco!
    Eu: Quem te sacaneou desde pequena, Helga?
    Helga: Muitos, minha família, minha mãe que sempre foi um diabo em forma de gente, meus irmãos desgraçados, mas, principalmente, os malditos pastores da igreja em que me obrigavam a ir. Ainda bem, se é que posso dizer isso, que não era só eu a fodida lá, literalmente.
    Eu: Bandos de filhos da puta! Todos esses ditos Pastores, Padres e demais estelionatários da vida, para mim são todos um bando de filhos da puta que uma bala na cabeça de cada um, seria caro, mas pelo menos seria um favor à humanidade. Claro que nem todos são filhos da puta, deve ter algum sujeito que preste no meio do mar de merda da religião, mas 99,999% é tudo bandido, pedófilo, ladrão, canalha, psicopata, lixo humano. Por isso chamo essa cambada de Religiopatas!
    Helga: Ah, sim, sempre tem um ou outro que presta nesse meio, mas não fazem nada contra o bando de maníacos e viciados em dinheiro e poder, o que no final das contas os torna cúmplices de seus pecados e crimes.
    Eu: Concordo!
    Helga: Você não faz ideia do que esses malditos são capazes de fazer.
    Eu: Não precisa falar nada. Posso imaginar.
    Helga: Não tenho mais problema com isso. Mas, se eu pudesse matar a todos, eu o faria, como Judite fez com Holofernes.
    Eu: Tô ligado, muitos imbecis nesse mundo discutem se a história de Judite é real ou não, falam muito das pinturas do Caravaggio, do Francisco de Goya retratando a vingança de Judite contra Holofernes, mas poucos falam da mais esplêndida versão pintada por uma mulher, Artemisia Gentileschi. Artemisia, ainda bem jovem, foi estuprada por seu mestre, Agostino Tassi e o ajudante dele, Cosimo Quorli. Dois velhos malditos, que ainda saíram impunes, restando a Artemisia apenas seguir em frente em sua vida e ela o fez vivendo até os 64 anos de idade.
    Helga: Isso se parece com a minha história.
    Eu: Caramba, Helga. Não sei o que dizer, apenas que tais tipos merecem bala na fuça, nada mais que isso.
    Helga: Eu era uma menina de apenas 11 anos, mas havia outras meninas de quase a mesma idade, 11, 12, 13. Os pais idiotas levavam as filhas para os Pastores as abusarem e ainda botarem o terror em suas cabecinhas dizendo que se elas contassem alguma coisa, o diabo iria matar todas as pessoas de nossas famílias. Foi hediondo, horrível, graças a Deus, pouco me lembro, mas o pouco prefiro nem lembrar. Alguns dos desgraçados já morreram, mas outros ainda estão vivos e, adivinhe? Os filhos dos pastores continuam fazendo a mesma coisa até hoje.
    Eu: E por que caralhos ninguém faz nada?
    Helga: Já teve gente que tentou acabar com isso dentro da igreja, mas ou acabou morto ou expulso e taxado como abusador ou louco. Ou seja, os verdadeiros bandidos, que se escondem atrás da igreja, invertem a situação sempre que são quase pegos e acusam os outros, quem os denuncia, dos crimes e pecados que na verdade eles é que estão cometendo. E os fiéis, em sua maioria, mesmo sabendo de todos os podres, fingem não saber, por puro fanatismo ou medo.
    Eu: Que inferno!
    Helga: Não é? O mais irônico é que até hoje não sei se me tornei puta por causa do abuso sofrido na igreja ou porque sempre fui assim, viciada em sexo, ou o que?
    Eu: Caralho, Helga. Que merda!
    Helga: Jezebel.
    Eu: Como assim?
    Helga: Após os 14 anos de idade, eles paravam de abusar de nós e então começavam a abusar de uma nova leva de crianças, a maioria eram meninas, mas também faziam isso com alguns meninos. As meninas que se revoltavam e começavam a querer falar dos abusos, eles chamavam de Jezebel, traidora, traiçoeira, endemoniada, prostituta e serva do Diabo, claro. E em outras igrejas por aí chamam as meninas rebeldes de Jezebel serva do Diabo, a grande prostituta de mil demônios, Dalila traidora prostituta ou como Tamar, a Tamar do Capítulo 38 do livro de Gênesis no Antigo Testamento, também chamada de prostituta perversa. Observe que quase todas as mulheres rebeldes da Bíblia são taxadas de malignas, diabólicas, prostitutas, perversas, pervertidas e que não demonstram nenhum pingo de remorso por seus atos pecaminosos, criminosos e traiçoeiros. E que, por isso, mereceram a morte violenta como pagamento pelas suas iniquidades.
    Eu: De fato, há muitos casos de mulheres tratadas como diabólicas na Bíblia. E isso levou a sociedade fake, dominada até pouco tempo pelos imbecis dos homens que já levaram o mundo a duas guerras mundiais e quase destruíram esse Planeta, desde tempos imemoráveis, a ter cautela com as mulheres, principalmente, em posição de Poder.     
    Helga: E o que você acha?
    Eu: Sobre o que?
    Helga: Sou perigosa? Você deve ter cautela comigo?
    Eu, em tom de ironia: Eu não tenho nenhum medo de você, afinal, não tenho grana, nem onde cair morto direito. Mas, se eu fosse o Alfonso, dormiria com os dois olhos abertos.
    Helga, rindo e bebendo, já meio doida: Cafajeste!
    E as horas foram passando, fomos bebendo até acabar a bebida, fomos fumando até acabar o cigarro e fomos cheirando o pouco pó que ela tinha até acabar o pó. Depois de várias sessões de sexo, cheios de pinga no couro, apagamos.
    No dia seguinte, Helga tinha se mandado bem cedo. Bom, não dei a mínima, esse tipo de mulher louca só quer ser ouvida, foder e ser fodida e depois de pirar o cabeção, fazer drama com as historinhas de suas cabeças, que só Deus sabe se são verdadeiras ou meras conversas fiadas, geralmente elas dão no pé, de preferência com algum dinheiro que afanaram da sua carteira. Como eu não tinha nada de dinheiro, pensei que tivesse levado alguma coisa da casa, mas nada levou.
    Levantei para urinar e enquanto jogava uma água na cara, ouvi um barulho de portão, pá pá. Olhei pela janela, era a maluca da Helga. A louca foi buscar café e uns pães de queijo.  É mole?
    Eu: Que porra você acha que tá fazendo, Helga?
    Helga, sempre rindo feito louca, como se nunca ligasse para que os outros dizem: Ué, fui pegar um café, só isso. Se não quiser tomar, deixa aí, mas não me enche.
    Eu: Cacete, Helga.
    Esperei ela tomar a porra do café e lhe disse: Helga, vou pedir, com todo o respeito do mundo...
    Helga nervosinha, nem deixou eu terminar de falar e já vociferou: Tá, tá, tá bom! Já entendi. Tô vazando. Tchau Robe.
    E assim, Helga pegou a bolsinha de puta e se mandou, batendo portão na sua enorme bunda ao sair. Só pensei comigo: que vaca louca da porra! E, graças a Deus, depois daquele dia, nunca mais vi a Helga, não no sentido de dormir com ela, mas volta e meia, ela sempre estava lá no bar, se pegando com Zelão e outros loucos. Até tentou me encher um dia desses mas cortei na hora. É preciso 'olho vivo e faro fino' em relação a 99,999% das pessoas que você encontra nesse mundo louco. Há pessoas que, independentemente de serem mulheres ou não, é melhor você manter quilômetros de distância. E, sem dúvida, existem pessoas tão loucas nesse mundo que são capazes de tudo, até mesmo parecerem profundamente verdadeiras. São justamente esses tipos lunáticos que com um corpo maravilhoso, um sorriso apaixonante, um olhar arrebatador e um bom papo arrebentam mentes, estraçalham corações e fodem almas, sem dó, nem piedade, tendo zero remorso. Lindas, loucas e perigosíssimas, a maioria das mulheres com bolsinhas baratas e historinhas tristes.
    Tempos depois, por acaso, falando com outro maluco de boteco, descobri que a louca da Helga veio de outra cidade há uns meses, que jamais morou onde disse que morou, ou seja, a historinha da igreja, pode ter sido mais uma historinha triste de puta para enganar trouxa. Fica o ensinamento às novas gerações de Homens, as putas loucas da vida são especialistas em drama, em histórias tristes, superando qualquer autor, escritor e contador de história, tranquilamente. E, certamente, numa sociedade fake como essa, num mundo entupido de idiotas como esse, esses tipos de mulheres loucas, como todos os tipos de politicopatas, corruptopatas, religiopatas, sub-celebridades e demais estelionatários da vida, fazem a festa, fazendo estragos maiores que um furacão, deixando miríades de sujeitos na rua da amargura, ferrados, falidos e à beira do suicídio. Portanto, cuidado! Bobeou, dançou.

A freira

        Um dia, numa dessas viagens que temos a raríssima sorte de sentar ao lado de pessoas interessantes, em meio a uma longa conversa com uma Irmã (Freira) carola sabidamente concupiscente, do nada, ela me disse: mas por que você não para com essa coisa de filosofia e escreve livros sobre Jesus? As pessoas gostam mais de livros que tenham Jesus na história.
    Pois é, eu até já fiz Faculdade de Filosofia, faltou um ano apenas e só não me formei por causa de uma velha professora nazifascista que resolveu me pegar para Cristo. Tá, eu fui ‘meio vagabundo’, mas pelo menos 60% foi culpa da velha nazi safada. Mas, esse é um assunto para outro tempo.
    Antes de responder a Irmã, tive uma puta dor de barriga de tanto rir. Após, disse-lhe, obviamente em tom amigável, porque essa era a natureza da nossa conversa: sabe, Irmã, máxima data vênia ao que vou lhe dizer, um dia ainda vou escrever um livro filosófico com putaria, guerra, ação e pilhérias envolvendo Jesus, os Jesuítas e o banho de sangue que causaram com o extermínio de povos indígenas nas Américas, algo tipo humor diabólico e sinistro, algo que choque para valer, que cause escândalo, algo que valha a pena mesmo e que tenha potencial de levar qualquer um para a fogueira da Inquisição, muito embora a Opus Dei diga que esses tempos já se foram.
    Curiosamente, ela que tinha uma energia e tanto em seu olhar penetrante, riu e asseverou: você sabe que na Cruz, Jesus disse, 'Pai, perdoa-lhes pois não sabem o que fazem'.
    Lhe redargui baixinho, ao pé do ouvido, em tom de brincadeira, quase sussurrando: você se refere ao mesmo Jesus que também disse, segundo as Sagradas Escrituras: Pai, meu Deus, meu Deus, por que me abandonastes?
    Ela, com os pelos do braço levemente arrepiados, riu em silêncio, balançando levemente a cabeça, com o dedo de lado nos lábios, encostada na janela do ônibus, enquanto admirávamos o Sol se pondo no horizonte.
    Depois daquela viagem, nunca mais a vi. Contudo, numa certa tarde, num sábado qualquer, o telefone tocou, atendi e do outro lado da ligação, uma voz feminina dizia: adivinhe quem é?
    Eu: não faço a menor ideia.
    A voz: sou eu, a Irmã do ônibus.
    Pensei comigo, cacete! E respondi: Caramba, quanto tempo ein? E aí? Que contas? Quais as novas?
         Irmã carola concupiscente: tô aqui na capital tomando uma cerveja. Tá um dia lindo, tô com umas amigas na boate que abri. Liguei pra saber quando você virá me visitar.
    Pensei comigo outra vez: só pode ser trote, trollagem, pegadinha! Tinha uns amigos que gostavam de fazer pegadinhas do tipo, há muito tempo atrás, no tempo quando as pessoas ainda tinham o costume de ligar umas para as outras. A Irmã, abandonou o Hábito para abrir uma boate? Só pode ser brincadeira! Mas, depois de falar mais com ela, com delongas, vi que a história era verídica, e então, lhe disse que um dia desses iria visitá-la, mas nunca fui. Não sei que fim levou a Irmã carola concupiscente, e espero que tenha se dado bem no seu novo ramo. Lembro-me que, na ocasião, ela me disse: "aquelas conversas sobre filosofia, sobre Nietzsche, Cioran, Voltaire e Nelson Rodrigues me abriram a mente ein?!".  "Abriram a mente", dizia ela. Espero que para melhor, porque geralmente, quem não está preparado para certos autores, filosofias, ideias, enfim, acaba ficando louco, pirando o cabeção, tomando atitudes malucas como se o mundo não tivesse mais sentido ou como se fosse acabar amanhã depois do almoço e, assim, acabam fodendo a vida para valer, irremediavelmente.
    A verdade é que ninguém muda porque alguém o influenciou ou lhe disse para mudar, ou porque algo o fez mudar. As pessoas mudam, apenas isso. As coisas mudam, o mundo muda, os tempos mudam, as mentes mudam, umas mudam mais que as outras, umas demoram para mudar, outras mudam toda hora. Umas mudam para melhor, outras para pior, outras ainda para muito pior e outras nem tanto. O fato, definitivamente, é que tudo muda, todos mudam, é o curso da vida. Nada mais do que isso. Marat e Robespierre se diziam incorruptíveis e do bem, mudaram para o mal e resolveram fazer um banho de sangue perseguindo e matando milhares no auge da Revolução. Poderiam muito bem ter ficado de boas, mas resolveram se achar 'os bonzão', perseguir, massacrar e, no final, se lascaram. Marat levou uma facada no bucho da Charlotte Corday, Robespierre foi pro pau na guilhotina. Dois grandes idiotas. Não é?
    Contudo, é verdade que na atual sociedade fake, a maioria das pessoas se "auto-canalhizam" e vivem vidas fakes com medo de não serem mais aceitas em bando. Assim, se tornam mais vazias do que já eram e facilmente controladas e manipuladas como meras vacas de presépio. Por isso louvo pessoas como a, Irmã Carola concupiscente, pessoas que tiveram a audácia e a coragem de mudar para se sentirem vivas de verdade, para viver de verdade, pouco se fodendo para o que outros vão pensar.
    Mudar para ser você mesmo de verdade e Ser melhor de verdade, principalmente, diante de você mesmo, não é para qualquer um, sobretudo, nessa era da ditadura dos idiotas, principalmente, na gadizada República dos Macunaímas.
    Se auto-desafiar a mudar para melhor em todos os sentidos, mas, principalmente, em nível mental, psicológico, moral e espiritual não é para qualquer um, definitivamente, porque isso enseja se desapegar da vida antiga, da maioria dos vícios, das manias, dos medos, das ilusões e, principalmente, desapegar de si mesmo. É por isso que a maioria esmagadora dos bilhões de animais pensantes preferem continuar na mesmice, fingindo, mentindo 'convencendo as paredes do quarto'. Tem que ter 'culhão', isto é, ter mente, alma, coração, coragem, loucura de verdade para Ser de Verdade e Ser melhor de verdade, superar a si mesmo, transcender a si mesmo e Ser, finalmente, a sua melhor versão.


Ser sozinho, uma ova!

    Talvez a solidão seja a maior invenção do Romantismo e a melancolia até contribua para as mais profundas reflexões. Contudo, o fato é que ninguém consegue viver completamente sozinho. Sozinho, ninguém é nada, ninguém faz nada, ninguém consegue nada, ninguém chega a algum lugar. Maquiavel tinha vinho e os pensadores com quem dialogava todas as noites. Descartes conservou até o fim um amor platônico por uma jovem estrábica. Albert Camus amava a sua obsessão pela morte, até morrer num acidente de carro aos 46 anos de idade. Kant tinha um cachorro com quem falava enquanto filosofava sobre a perturbadora Crítica da Razão Pura e que foi o seu companheiro de caminhadas por vários anos. Napoleão, preso na Ilha de Santa Helena onde ficou até a sua morte, tinha Hudson Lowe, que o infernizava mas pelo menos tinha com quem falar. Bukowski tinha 'um bando de gatos' por toda a casa. Sartre tinha um medo sinistro de crustáceos, principalmente, polvos e lagostas. Schopenhauer tinha uma matilha de poodles com o mesmo nome, 'Atma', palavra hindu para 'Eu Interior'. Nietzsche, louco por frutas e que, às vezes, comia até três quilos delas, dissera irônica e jocosamente a nós, seus melhores e piores amigos, os leitores, que alguns acreditam que Deus, estando cansado de ficar sozinho, resolveu criar a humanidade. Já Voltaire, viciado em café e que chegava a tomar até 40 xícaras por dia, não tão ironicamente, dirá que 'se Deus não existisse era preciso inventá-lo'. Ou seja, ninguém consegue existir sozinho, nem Deus vive sem a humanidade e nem a humanidade vive sem Deus, uma força maior, ainda que essa força maior possa, eventualmente, não passar de uma alucinação causada pelo medo da solidão. O Homem da Idade da Pedra sentia a solidão? Alguns dirão que não, não até os ossos como muitos de nós a sentimos, mas o fato é que sem a Mulher, o Homem jamais teria saído da Idade da Pedra, muito embora muitos tenham saído da Idade da Pedra e Idade da Pedra não tenha saído deles. Então quando dizemos, por raiva, revolta ou burrice que 'nascemos sozinhos e morremos sozinhos' à quem achamos que estamos enganando? Em nosso último segundo nesse mundo cão, por mais sozinhos que possamos estar, não estaremos solitários porque sempre haverá alguém ou alguma coisa em nossa mente, enquanto a nossa vida toda passa diante de nós e então partimos como Viajantes da Luz na Escuridão.  

 A mente como uma máquina do tempo

    Numa certa época, há muito tempo 'na história pra trás', sem nenhuma crise de consciência, eu passava os dias bebendo, tocando violão, compondo, lendo tudo o que eu podia ler, por mais perda de tempo e inútil que fosse. Buscando entender 'o que é isso tudo, a vida?', eu usava a minha mente como uma máquina do tempo, e como se viajasse no tempo de fato, eu imaginava como viviam e pensavam as pessoas em todas as eras, desde a loucura que seria viver e morrer na Idade da Pedra, como era a rotina dos homens e mulheres dessa era longínqua. Imaginava a indignação e a ironia de Sócrates ao saber que foi condenado à morte por causa das suas opiniões antes mesmo de ser julgado, sobretudo, por falar algumas de suas verdades aos endinheirados de sua época que se achavam donos da verdade e do mundo em Atenas. Também, imaginava eu como foi para César quando percebeu que tinha caído numa tocaia em pleno Senado feita por um cara como Brutus, a quem ele tinha um grande afeto e que iria morrer, será que César pensara que teria sido melhor ouvir seus instintos sobre Brutus, que cedo ou tarde ele aprontaria alguma coisa? Imaginava ainda sobre o que de fato sentiu JC quando disse: 'Pai, por que me abandonastes?', o que sentiram os pais de Hitler quando ele nasceu, o que sentiram os que sabiam que iriam morrer quando da Gripe Espanhola, o que se passou na mente do primeiro homem que deu o primeiro tiro na Primeira Guerra Mundial, a profunda e dramática tristeza que sentia Santos Dumont no momento em que passava a gravata em torno do pescoço pronto para cometer suicídio, a até a profunda angústia de Oppenheimer quando do teste da Bomba H 'Trinity' em Los Alamos e tantas outras coisas que eu loucamente imaginava.
    Com efeito, não imaginava-me apenas como observador à distância, mentalmente, eu me imaginava dentro da cena, invisível aos personagens do tempo em questão, podendo, assim, chegar próximo de César e imaginar sentir o seu último suspiro ensanguentado, ou estar do lado da Cruz de JC na hora em que Longinus enfia-lhe 'a lança do Destino', imaginando ver o sangue vermelho vivo, como o de todos os mortais, jorrando para todo o lado enquanto sua vida se esvai, ou a estranha alegria de Klara olhando para aquele indefeso menininho de olhar azulado magnético sem imaginar que ele um dia levaria o mundo à beira do caos total, ou ainda imaginar estar no quarto com Oppenheimer quando ele sentiu que o Câncer na Garganta iria matá-lo e imaginar se, na mente dele, isso seria uma punição, uma libertação ou nada disso, enfim.
    E assim eu passava meus dias, caminhando entre a história e a filosofia, como numa máquina do tempo, entre os pensadores principais, mas sobretudo, entre os menos importantes, escrevendo e refletindo sobre essas coisas todas e também sobre Vida, morte, depois, agora, futuro, passado, presente, sempre me perguntando, como até hoje, nesse agora, faço: por que diabos existe tudo o que existe? Qual é a porra da lógica de tudo existir? Se Deus existe, de onde ele saiu? Do nada absoluto? Da Escuridão? Deus foi criado, como todos nós? Quem criou Deus? E quem criou o Deus que criou Deus? E antes? E antes? E antes? De onde raios veio tudo? Para onde raios vai tudo? Qual o sentido da vida de fato? Há algum sentido nessa porra toda? Alguns dizem: 'Nós é que damos nosso próprio sentido à Vida', e daí? Isso nos livrará dessa insana desolação eterna? Algum dia chegaremos a alguma resposta para essas coisas interessantes e, ao mesmo tempo, perturbadoras? Ou só teremos a imaginar, como que usando nossa mente como uma máquina do tempo, viajando bilhões de anos no futuro, no espaço/tempo e para além disso tudo, ainda que isso seja uma puta perda de tempo, inútil?
    Na Faculdade de Filosofia, certa vez, fiquei sabendo do suicídio de um cara do quarto e último ano, um cara legal, bem-sucedido na vida, um Arquiteto que fazia Filosofia. Ele se matou pulando do prédio onde morava, uma morte horrenda. Numa das anotações que ele deixou, estava sublinhada sobre os 201 termos "Objetos" contidos na Crítica da Razão Pura de Kant, quase como uma estranha alusão crítica a Descartes que dizia que "Os sentidos nos enganam", o cara suicida, dizia, então: "Não são os objetos que nos enganam, nós é que nos deixamos enganar pelos objetos". Por que diabos ele teria deixado aquilo sublinhado, saltando aos olhos de todos? E lá fui eu, com a minha mente/máquina do tempo, ler a insuportavelmente pesada, Crítica da Razão Pura do Kant, pela enésima vez e, ao mesmo tempo, imaginar/ver o cara, largar o marcador de texto, fumar o seu último cigarro, caminhar lentamente para a janela, abri-la e decididamente, sem pestanejar, pular para a morte com um olhar vidrado num horizonte de nada absoluto, até o impacto. Qual seria o nível de dor que a pessoa sente naquele micro-tempo/espaço, naquele milésimo de segundo antes do fim? O que se passará na cabeça da pessoa na hora do impacto? Quem saberá? Mais de um milhão de indivíduos se suicidam todos os anos em todo o Planeta. Por que as pessoas se matam? Durkheim dirá que "na maioria das vezes, o indivíduo portador da 'ideia do suicídio' quase sempre não sobrevive". A verdade é que ninguém saberá exatamente o porquê.
    E assim, sigo caminhando pela história desse mundo cão, até os dias de hoje, bebendo menos na casa perto da casa dos 50, mas com a minha mente afiada, quase sempre, transformada numa máquina do tempo, tentando entender, ver de perto, sentir de perto, por uma combinação de uma insana imaginação, advinda da soma das experiências da vida, dos livros, das longas pesquisas, dos estudos, sobretudo, pela leitura teórica e prática da vida, da realidade e da supra realidade. É por isso que beber é algo quase sagrado para mim. Também, ir ao bar beber junto aos loucos, idiotas, cornos e putas, ainda que conservadores, conversadores, burros pra caralho, é uma espécie de terapia, auto-terapia. Sim, no fundo eu os detesto, mas eles me divertem, compreende? Viver é preciso, ainda que certos estilos de vida possam ser uma tremenda idiotice, como o meu.
Certo dia, sentado à mesa do bar, tocava a canção do ACDC na Jukebox, You Shook Me All Night Long, que dizia assim, em tradução simples:
"Ela era uma máquina veloz, ela mantinha o seu motor limpo
Ela era a melhor mulher que eu já tinha visto, porra
Ela tinha olhos sinceros, não me dizia mentiras
Me nocauteava com as suas coxas americanas
Aguentava tudo, me deixava sem ar
Ela me chamava, mas eu já estava ali
As paredes tremiam, a Terra balançava
Minha mente doía, e nós fazíamos amor
E você, me agitou a noite toda
Trabalhando acelerada na linha da sedução
Ela era única, era minha, só minha
Ela não queria aplausos, apenas fazer outra vez
Ela me fez de refeição e ainda queria mais
Tive que me refrescar para aceitar outra rodada
Agora estou de volta ao ringue para agitar novamente
As paredes tremiam, a Terra balançava
Minha cabeça doía e nós fazíamos amor
E você, me agitou a noite toda".
    Que Música com M Maiúsculo fodástica! Não é mesmo? Nesse mundo tomado por idiotas, tem zilhões de porcarias que alcunham de arte, música, filosofia, coisa especial, mas nós, os Viajantes da Luz na Escuridão, sabemos que pouquíssimas são as coisas verdadeiramente fodásticas, as coisas que prestam e as pessoas que valem a pena. Verdade seja dita, 99,999% das coisas que vemos, ouvimos, lemos, 'consumimos', são de quinta categoria, independente do preço delas ou do valor que as manadas de imbecis deem a elas, assim como grande parte das pessoas com quem cruzamos, durante as 23 horas, 56 minutos e 4,1 segundos em que o Planeta leva para dar um giro no abismo sideral e que nós chamamos de dia, são medíocres, nada inspiradoras, brochantes. Que Deus nos livre das coisas de quinta categoria e das pessoas brochantes. Antes, um porre de perder os sentidos, uma viagem profunda de qualquer alucinógeno, antes a morte prematura do que uma vida inteira cheia de coisas de quinta categoria e pessoas brochantes.    
    Voltando a falar daquele momento, ao ouvir aquela canção fodástica, refletindo sobre o 0,001% das coisas de categoria e de estilo e das pessoas que nos dão tesão de viver, perguntei a mim mesmo à época e agora pergunto a você caro leitor, cara leitora: acaso alguma vez alguém fez você se sentir assim na cama e na vida? Nocauteado, detonado, comido por dentro e por fora, mas mega feliz, satisfeito, mais vivo do que nunca em todos os sentidos e ainda querendo mais?
    A maioria dos bilhões dos animais ditos pensantes sobre a Terra jamais terão tal experiência e, consequentemente, jamais se sentirão vivos de verdade, querendo mais e querendo viver trezentos anos, sobretudo, essas novas gerações de otários, frescos e complexados, guiados por ideologias partidárias, politicopatas, corruptopatas, religiopatas, sub-celebridades lixos e demais picaretas existenciais que usam uma das maiores armas de controle de idiotas em massa, o politicamente correto.

Carla Blitzkrieg

    Graças aos bons deuses do hedonismo, eu já vivi mais de uma vez esse tipo de Experiência com E Maiúsculo. Ela era como a Mulher da canção do ACDC, ou seja uma Mulher que comia um homem vivo, devorava seu coração, fazia sua alma de gato e sapato, palitava os dentes com seus ossos e os jogava fora como se fosse nada, do jeito que o Diabo e um Homem de verdade gostam, mas no final, o fazia se sentir novo em folha, mais vivo e mais forte do que nunca.
    Um dia, a reencontrei num boteco ao lado da rodoviária de uma cidade pequena, junto de uma amiga. Ela era puta, declarada puta, mas uma puta de respeito, de moral, extremamente bonita, talvez a Mulher mais bonita de uma cidade de interior. Eu já a conhecia de outros carnavais e fazia tempo que não a via por aquelas bandas. Eu estava com um colega de trabalho, que também apreciava uma boa farra com bebidas e mulheres devassas e, como ele tinha recebido o vale, já sabíamos a que fim aquilo tudo nos levaria.
    Era impressionantemente como era com a Carla, era o nome dela, ou pelo menos o nome que ela dava para todo mundo. Com seus 22 anos, cabelos loiros, sorriso malandro, corpo firme, com tudo no ponto de bala, ela era aquele raríssimo tipo de Mulher de olhar esverdeado, loucamente verdadeiro, cheia de energia, tesão, vontade, vida, inspiradora e que parecia já ter lido o manual do homem de cabo a rabo, inclusive as letrinhas miúdas e, por isso, já sabia onde pegar, como pegar, mesmo sem nunca ter visto o sujeito antes. Bastava se sentar perto dela para ficar mais duro que uma barra de aço. O mais louco é que após uns dois litrões, sentada do meu lado, ela já metia a perna dela por cima da minha, sem perguntar nada, e já partia pra cima atacando de maneira mais veloz que a Blitzkrieg quando da invasão da França. E como beijava bem! Se tem uma coisa que eu gosto é de beijar, de cima a baixo e ser beijado, ser lambido, chupado, engolido, devorado igualmente de cima a baixo e Carla sabia fazer isso tudo como ninguém. Para mim, mulher que não beija, que não parte com tudo é uma mulher esquisita, triste e que, provavelmente, tem sérios problemas mentais, psicológicos ou que o valha. E olha, posso dizer, talvez a maioria das mulheres tem alguma trava que as impede de se soltarem e serem felizes de verdade, pelo menos na cama. Por mais estimuladas, por mais que se esforcem, prisioneiras de suas próprias mentes, elas não conseguem e voltam correndo para o seu mundo de "consciência falante", o mundinho de bem e mal, bom e mau, certo e errado, santo e pecado. De fato, a maior trava de todas é a moral e tem a ver com criação, educação, religião. Tem mulher que simplesmente não gosta de sexo, tem mulher que gosta mais ou menos mas jamais faria um sexo fodástico como o da canção do ACDC se restringindo ao 'feijão com arroz' e fazem o sexo brochante, por obrigação, só lá de vez em quando. Nesse grupo de mulheres, estão as casadas que, em sua esmagadora maioria, são frígidas ou se tornam frígidas. Observem bem, 'em sua esmagadora maioria', isto é, nem tudo está totalmente perdido, afinal, há, por mais raro que seja, mulheres casadas mais fogosas que qualquer jovenzinha de 18 e essas fogosas, geralmente, precisam mais de uma mangueira para resolver a parada. Essas fogosas, casadas, em toda a parte mas principalmente entre a elite, a alta classe, são o que comumente chamam de 'damas na sociedade e putas na cama', só que, putas, não com seus maridos, invariavelmente. Ou seja, na solidão de sua vida dupla, entre as quatro paredes de um motel, na mesa de um escritório, no banheiro de um restaurante ou dentro de um carro após dizerem que foram à farmácia, com o pedreiro da obra, com o entregador do gás, com o motoboy, com o cara que conheceram pela internet, com o amigo de trabalho ou mesmo com um sujeito que andava pela rua, essas mulheres, insaciáveis e incontroláveis, suspendem todo e qualquer tipo de senso moral, toda e qualquer tipo de trava e partem para a felicidade sigilosa, para se sentirem vivas, renovadas e querendo viver mais trezentos anos, ainda que isso dure apenas alguns instantes e sob forte adrenalina por temor de serem pegas e perderem suas vidas de luxo e comodidade.
    Fora disso, no mundo dos reles mortais como nós, contudo, graças aos deuses do hedonismo, ainda tem Mulheres como Carla que gostam de fazer tudo e fazer bem feito, sem qualquer vergonha na cara, sem medo de ser feliz, sem trava alguma, várias vezes, até o sujeito pedir água ou ela também pedir água, porque, Mulheres como Carla, detonam qualquer um mas, de vez em quando, encontram um louco como ela que também a detona.
    É importante ressaltar aqui que o sexo de fazer as paredes tremerem e a Terra balançar, como diz a canção, não é uma coisa depravada, uma coisa absurda, uma coisa modinha como dos filmes e séries, mas uma coisa verdadeira, linda, pura, profunda, uma coisa que merece ser chamada de 'fazer amor', porque é amor, um amor hedonista supremamente verdadeiro, de mente, coração, corpo e alma. Tal tipo de sexo, que faz você se sentir vivo, jovem, renovado e fortalecido em todos os sentidos, querendo mais, querendo viver trezentos anos, penso, é uma das maiores e mais belas formas de celebração da vida. Quem nega a si próprio tal direito supremo, vive uma vida de merda, uma vida fake.
    Naquele dia, após tomarmos vários litrões, com Carla me pegando para todo lado, literalmente me deixando todo melado e eu alternando entre um e dois dedos sentindo ela molhadíssima, pronta para o 1º round, pedimos um táxi e nos mandamos para a casa da amiga dela. E lá fomos, Carla, Fábio, Zinha e eu. Já estava caindo a noite e lá, bem à vontade, tomamos, fumamos, comemos, nos divertimos, conversamos sobre tudo, história, política, filosofia e sobre os benefícios do sexo oral pela manhã. De repente, fomos ao quarto e, após prolongar o tesão, nos pegamos com tudo, com força, com tudo que se possa imaginar e mais um pouco, igualzinho a música do ACDC e foi maravilhosamente ótimo, várias vezes! Afinal, o que é ótimo precisa ser repetido, revivido, não é?
    Após vários rounds, sobretudo, após relaxar e beber mais um pouco, Carla desabou na cama, eu também apaguei após um cigarro. O amigo Fábio deu seus pulos com Zinha que não era lá grande coisa e tinha seus quarenta e poucos anos. Zinha quis fazer uma comida para Fábio mas ele, não sei o porquê, resolveu dar no pé e saiu correndo pela rua, feito doido, em meio à chuva que começara a cair. Vai saber o que se passa na cabeça de um cara normal após o coito, não é? Eu nunca tive problemas tais porque nunca fui normal. Pois bem, após ver aquela cena toda, fui ao banheiro e voltando pela sala, Zinha estava se preparando para dormir com aquela bundona à mostra. Parei e fiquei observando e pensando enquanto Carla roncava forte desmaiada no quarto. Zinha se virou e sorriu malandramente: tá sem sono? Respondi: é, tô. No segundo sorriso malandro e convidativo, parti pra cima feito Urubu na carniça. Enquanto ela baixava sua calcinha dizia: mas e a Carla? Não vai acordar? Eu só querendo botar pra dentro, disse-lhe, não vai, não se preocupe. E assim foi, pau na Zinha, malandrinha. Depois, voltei para o quarto, sorri, dormi e quando acordei pela manhã, já acordei com Carla pegando forte e já engolindo a barra de aço. Tem coisa melhor do que uma safadeza, ainda que de vez em quando? Alguns dizem que tem, mas ainda estou para conhecer. Se pudesse passar a vida inteira na putaria, eu passaria, sem nenhuma crise de consciência. E que atire a primeira pedra do juízo moral quem nunca gozou na safadeza! Não é?
    Depois de um dia e uma noite toda na gandaia, tomei uma xícara de café amargo, forte, me despedi de Carla e Zinha e sai caminhando pelas ruas do bairro. Fui numa boa até a rodoviária, peguei o ônibus de volta para cidade maior, cheguei no cafofo, dei comida para o cachorro, deitei, liguei a TV, desliguei a TV, me virei para o lado e dormi. O descanso merecido dos heróis.
    Um homem só precisa ser homem e uma mulher só precisa ser mulher. Não há outro lugar nesse mundo onde homem e mulher são o que são de verdade senão na cama, todo o resto é romantismo barato. E quanto romantismo barato, idealismo inútil e utopias são necessários para que uma sociedade fake exista? Os que não se encaixam e não se reconhecem mais como homens e mulheres, seja por uma tendência da natureza, traumas de infância, por escolha própria ou qualquer outro motivo, tem o direito de viver e ser como eles quiserem, dar para quem quiserem, comer quem quiserem e, sobretudo, serem felizes como bem entenderem. É simples assim, e qualquer briga sobre diferenças, além de brochante, inútil, burra e má só conduz as pessoas a se dividirem, se enfraquecerem enquanto coletividade humana, para pseudo-benefícios de alguns merdas, rumo ao abismo de si mesmos e a extinção mútua.

O pior tipo de mulher

    A mulher que não transa é, sem sombra de dúvida, o pior tipo de mulher. Muitos dirão: "mas não existe mulher que não transa". Ah existe sim, a frígida, ou seja, aquela que copula como uma boneca inflável, com zero emoção e tesão, extremamente brochante. E há mulheres terrivelmente frígidas que, além de tornarem suas próprias vidas um inferno insípido, transformam a vida dos outros num inferno insosso, um tédio infernal. A mulher frígida é o outro extremo da ninfomaníaca. A principal característica da mulher frígida não é só a falta de tesão, a ausência de qualquer desejo sexual, mas a falta de vida, a falta de tesão pela vida. Viver com uma mulher sem tesão é como viver sem tesão, acorrentado a um iceberg. O pior de tudo, é que esse tipo infeliz de mulher faz o sujeito muitas vezes pensar que é 'o problema da história', 'o louco', 'o taradão', 'o mal' quando não é.  
    Certa vez, um colega de boteco disse-me que foi casado por mais de 13 anos com uma mulher assim, vazia e sem tesão. Obviamente, ele teve várias amantes, 'uma por semana', segundo ele. A mulher frígida, sem sal, sem tesão e sem vida, sabia que ele a corneava, eles brigavam de se matar, mas no fundo ela ficava ali que nem uma flor morta pelo inverno, como uma verdadeira mulher sem tesão pela vida. Segundo ele, apesar de tudo, gostava da companhia dela, mas após 13 anos de uma vida sem tesão, brigas e tudo mais resolveu, numa bela manhã, entrar no carro velho como fazia todos os dias para ir trabalhar, mas no final da tarde, ele não voltou mais. "Não aguentei mais, sério. Estava a ponto de me matar de tanta tristeza, diante daquele insuportável clima de velório naquela casa. Simplesmente sumi. Fui para outra cidade e comecei tudo de novo. É claro, com muita dor no coração por causa das crianças peludas, os bichos de estimação que tínhamos e que eu os via como filhos. Mas, às vezes, infelizmente, é preciso cortar um pedaço do coração para não perder a mente e a alma de vez. Sempre que dava, eu passava pela frente da casa vê-los, até após vários anos depois, um dia passei e vi que eles não estavam mais. Perguntei aos vizinhos sobre o que havia ocorrido e eles me disseram que morreram. Provavelmente, de idade, velhice. Quanto a ela, vi uma ou duas vezes por ocasião da papelada de separação. Sempre do mesmo jeito, sem vida, sem tesão, sem sal, como uma flor morta. Depois disso, nunca mais a vi e fiz questão de jogar tudo isso num poço profundo e cobri-lo com um caminhão de pedras. É a vida, amigo. Às vezes, precisamos rasgar o coração para salvar a alma e não tem coisa mais dolorosa do que você abrir mão de uma vida que você dava como certa. Envelhecer juntos.... Já parou para pensar que a maioria das coisas que de fato queremos, não sobrevivem? Não é uma merda? Por sorte, a vida sempre se renova e após um tempo deprê achei outra louca, que gosta da coisa como eu e nos damos muito bem já há uns dez anos".
    Ele, em sua simplicidade, como um peão da estrada da vida conta as suas histórias, me contou aquilo tudo e eu cheguei à conclusão de que, por maior que seja a paulada que a vida te dá, o tempo passa, as coisas mudam e, quando se acha que tudo já foi para o brejo, do nada, a mesma vida que lhe obrigou a cortar um pedaço do coração para não perder a alma, é ressignificada e você volta a se sentir vivo novamente. É claro que não existe 'oba oba', as merdas que acontecem ficam, há coisas que, infelizmente, não podem ser consertadas e nem deletadas e só o que nos resta é conviver com elas. Ainda que joguemos as coisas ruins num poço profundo e o cubramos com caminhões de pedra, elas ainda estarão lá.  É por isso, que na maioria das vezes, é melhor deixar para lá, entrar no carro da vida e seguir em frente, sem olhar para trás, sem se distrair com o retrovisor, apenas prestando atenção na estrada à nossa frente. Não é fácil, mas é preciso, e é por isso que pouquíssimos conseguem se desapegar de verdade e seguir em frente. É por isso, que a maioria se afunda junto com a vida de merda que levam, e muito antes de morrer, já se encontram mortos em vida, vivendo uma vida fake.

Lídia

    Lídia foi a segunda paixão louca que conheci no boteco bovino de família. Ela era casada, com um policial, portanto, trocentas vezes mais perigoso e mais tesão. De início a conheci, para falar a verdade, pelo 'falecido facebook', quando este ainda era habitável e as pessoas podiam conversar sobre outras coisas da vida para além da maldita política, e se conhecer, trocar ideias numa boa. Certo dia estava eu bebendo minha quinta garrafa de cerveja no boteco do Zelão/Seu Djair, num tempo em que a bebida ainda era ligeiramente barata no Brasil, quando vi aquela morena de olhos pretos e cabelos longos, meio gordinha mas bonita, curtindo umas postagens minhas sobre o universo e sobre qual tipo de cerveja era a melhor. Curtidas daqui e dali, de repente mandei um 'oi' no reservado e ali começou 'a saga da casada'. Ela tinha quase 50 mas com o corpinho de 25, uma loucura. Oi daqui, oi dali, o tempo foi passando e os papos de 'amigos do facebook' foi ficando mais intenso até que certa noite, antes de dormir, ela apareceu e ficou quase uma hora 'teclando' comigo.
    Eu: E o maridão?
    Lídia: Viajou.
    Eu: Hum...E você o que está inventando aí sozinha?
    Lídia: Ah nada demais, apenas vendo TV, bebendo um vinho e conversando com você, Robe.
    Todas me chamavam de Robe. Então, em tom de brincadeira, no melhor do "vai que rola?", disse-lhe: venha aqui ao cafofo, vamos beber juntos, ou eu vou até você?
    Ela riu 'kkkk': A vontade era grande, mas...É perigoso. Vamos marcar um dia à tarde, só nós dois?
    Essa é a vantagem de conversar com Mulher Madura e que sabe bem o que quer, já vai direto na jugular, sem rodeios. Claro, àquela altura, já éramos bons confidentes, e ela me contava tudo o que podia contar e até o que não podia, era uma relação de confiança mútua do tipo: "seu eu cair, levo você junto". O papo foi longe, mas após ela se arretar mais de uma vez, mandei a real e então, marcamos. Nunca me esquecerei da tarde chuvosa que eu encontrei com a minha 'amiga do facebook' ao vivo e a cores. Que revolução é a tecnologia! Ela estava cheirando um perfume docinho, discreto, tinha deixado o carro num estacionamento no centro e então a peguei e levei de moto para o cafofo do Robe, onde todos os desejos se realizam.
    No caminho, antes, ela receosa, dizia: Você sabe que meu marido é um Policial Militar, né?
    Respondi: Ah, sim, eu sei, ele é assessor do prefeito da cidade, parece que mais ou menos conhecido, não é?
    Lídia meio espantada, mas excitada: Então, já sabe que se ele nos pegar, nos mata.
    Eu: Calma, minha caríssima, Lídia, calma. Estamos apenas conversando, como bons amigos, não é? É apenas um passeio entre amigos, não é?
    Lídia: Espero que não me ache uma puta ou louca, porque eu nunca fiz isso, sério.
    Eu: Isso o quê? Dar uma voltinha como um amigo? Que mal tem mulher? Fique tranquila, logo retornamos e te deixo no estacionamento, você vai ver que vai correr tudo muito bem. E consegui tranquilizá-la. Nesses casos, a adrenalina vai a mil.
    Eu sentia que Lídia, de fato, gostava de mim, mesmo sem nunca termos nos vistos antes, sobretudo, acho que ela gostava mais da minha loucura, da forma como eu partia para cima, como um artilheiro quando vê a possibilidade de um gol e vai com tudo até fazer o gol e sair para o abraço.
    De fato, às vezes, o tesão e a vontade são tão grandes, que não damos a mínima para o perigo, ainda mais se tratando de uma mulher casada com um Policial conhecido na cidade! Já imaginou se algo dá errado? A merda estava feita. Mas, o fato é que fomos até o cafofo e lá o bicho pegou. Lídia, que já tinha quase 50 mas um corpinho de 25, fez, segundo ela, tudo o que há muito tempo tinha vontade de fazer, principalmente, engolir o pé de mesa e sentar nele com seu belo traseiro rebolando nas bolas. Por fim, ela fez o que disse que jamais faria com o marido, conservador e cristão ferrenho, tomar um belo jato de leite bem na boquinha e engolir tudinho. Foi uma tarde e tanto. Lídia queria mais e ficamos a tarde toda no rala e rola, até à exaustão. Tratava-se de uma mulher bonita, inteligente, decidida e, acima de tudo, discreta, cuidadosa em seus passos, maravilhosa e beijava maravilhosamente bem. Lídia gostava de beijar, principalmente, depois de tomar o leite todo. Quem ligaria? É meu mesmo. Não é?
    Depois a deixei no estacionamento, após mais uns amassos e um belíssimo sexo oral que ela fez de saideira. "Para você não esquecer de mim", disse ela.
    Como eu poderia esquecer? Minha mente sempre lembrará de Lídia, a maravilhosa, disse em minha mente. E então ela se foi. Mais tarde, eu já estava no boteco, vi ela com o maridão, numa foto de uma cerimônia na prefeitura, um casal lindo, de fato, um exemplo para a sociedade conservadora e cristã. Sim, é isso mesmo que eu achava, um casal lindo, sem troça, ironia ou pilhéria. O fato de Lídia e eu termos uma maravilhosa e inesquecível tarde, não muda nada a ordem das coisas, por mais fake que fosse a vida de casada dela. E afinal de contas, para todos os efeitos, nós nunca nos vimos pessoalmente, capiti?
    O fato é que depois daquilo tudo ela queria mais e nós nos vimos mais vezes, mas, chegou num momento, que confesso, senti a bosta gelar, meio que um sexto sentido avisando que, em estando nos arriscando demais, cedo ou tarde a casa iria cair e para que não desse merda para ninguém, resolvi dizer a ela, com dor no coração, que tínhamos chegado ao 'game over'. Ela não gostou nada e aí sim fiquei preocupado porque, uma mulher casada apaixonada pelo amante, é tragédia na certa. Todo mundo quando fica apaixonado, vacila e se lasca. Uma mulher casada quando fica apaixonada, se contrariada, quer ver o circo pegar fogo e o caminhão dos bombeiros cheio de gasolina.     
    De fato, me vi em papo de Urubu e deu o que ver para me desvencilhar de Lídia, mas com muito custo, ela acabou por entender que o que poderia acontecer, na certa, era uma cagada fenomenal, uma tragédia fodida, a morte à bala com nossos dois cadáveres expostos nos programas de sensacionalismo e em tudo que é rede social com o enunciado: "a mulher do policial e o amante mortos". Após mostrar a ela, bem didaticamente, o que iria de fato acontecer, isso durante vários dias, bebendo feito um condenado e de olho vivo para todo lado, ela finalmente caiu na real. Lembro-me que ela apenas disse, no final: 'poxa, nós poderíamos ter uma bela história, uma coisa legal juntos'. Eu, mentalmente, enquanto li aquilo, imaginando nossos cadáveres sendo recolhidos pelo IML: 'certamente seria bem legal', pro povão que gosta de escândalo, de ver 'presunto' na TV e depois fazer todo tipo de piada na rede social.
    Ela ainda tentou me contactar alguns meses depois, mas acabei por cortar toda e qualquer relação. Uns dois anos depois, dando um rolê com uns caras do Moto Clube ao qual fazia parte, fomos num bar de ricos para 'causar' e quando olho de soslaio, vejo Lídia e seu marido policial, entrando na festa com um monte de outros motoqueiros policiais. Confesso que me deu uma mistura de tesão e medo. Mais tesão do que medo, porém, ela apenas olhou uma ou duas vezes e depois eu me mandei para evitar uma cagada. Enfim, o medo é uma ferramenta útil para a sobrevivência da espécie e nem só de tesão viverá o homem, nem a mulher, por mais fake que seja uma sociedade. E assim, Lídia seguiu sua vida fake com em seu casamento fake, na alta sociedade fake. E eu segui na minha vida de louco, andando de moto, lendo, escrevendo bobagens e bebendo no boteco do Zelão/Seu Djair. É a vida e o Saulo de Tarso já dizia, sob o epíteto de Apóstolo Paulo: "tudo posso mas nem tudo me convém".

Iracema

    A verdade, meus amigos, é que se for botar bem na ponta da caneta, a maioria esmagadora das mulheres, gosta mesmo é de homem que não 'tá' tem aí, igual político, safado, mentiroso, bandido, corrupto, louco mas que faz. Quanto mais safado, melhor, desde que faça. Se os profissionais da mente um dia estudarem a fundo, virão que há uma certa relação entre a maioria das mulheres que gostam de homem safado e cafajeste e o povão que defende e vota no político safado e ladrão alegando: 'rouba mas faz'. Lógico, isso não significa que não existam homens bananas que gostam de mulheres cafajestes e safadas e que também fazem. Existem sim, mas certamente, o número de homens bananas que gostam de mulheres safadas é muito menor que o número de mulheres que gostam de homens safados. É mais fácil ter homens loucos ou sem noção que gostam de mulheres safadas, mas por outros motivos, como a sacanagem, do que homens bananas que gostam de mulheres safadas por submissão. Se fosse o contrário, a civilização já tinha ruído. A natureza, como já disse antes, é impiedosa e, cedo ou tarde, bota todo mundo no seu devido lugar. Por mais que existam ondas e modinhas sobre gênero que vem e vão, no final, a natureza se imporá e dirá: 'mulher foi feita para ser dominada e não para dominar. No sexo é assim, na vida é assim. Qualquer coisa que fuja dessa ordem natural, acaba dando merda. Isso não significa que eu defenda que a mulher deve ser submissa ao homem, não é nada disso, muito pelo contrário, ela deve caminhar lado a lado junto do homem. Agora, voltando ao início, é um fato que a maioria das mulheres gosta mesmo é de homem safado, cafajeste, que não está nem aí, mas faz. E o homem que não faz bem feito é logo substituído por outro que faz, e isso corrobora a tese de que mulher gosta mesmo de homem tipo político, que rouba seu coração, superfatura as suas expectativas, a engana, mas faz.
    Iracema era uma dessas mulheres que adorava um sujeito safadão e cafajeste, mas jamais demonstrava isso. Ela também era casada com um sujeito bem posicionado na sociedade, ambos eram espíritas. Eles também frequentavam o bar do Zelão de vez em quando, geralmente aos sábados e um dia eu estando lá conversando com a turma no balcão, o marido dela, um Engenheiro aposentado, puxou conversa sobre política e ela logo chegou e sentou ao lado dele no balcão. Iracema era uma mulher de 53 anos mas com um corpo muito bem conservado. A mulher quando tem grana, salvo raras exceções como disposições de saúde, se cuida e se preserva. É muito raro ver uma mulher rica escrachadona e toda zuada por aí. Ela tinha um cabelo curto, olhos esverdeados, um sorriso de menina malandra, era o tipo de mulher menina malandra, muito inteligente, perspicaz, sabia dar os sinais sem se arriscar. Gilberto, era o nome do marido dela, parecia ser um bom sujeito, meio arrogante como quase todo Engenheiro mas parecia ser bom. Aliás, no bar, todo mundo é 'gente boa', bonito, boa companhia, bem realizado, bem de vida, 'chique show', como dizia um 'moiado' que por lá passava sempre.
    E no meio de uma das muitas conversas aos sábados, ela me convidou para ir ao centro espírita tomar passe. Como sempre, o tal do 'vamos tomar um passe?'. Como já disse antes, já tive uma fase 'zen', 'zen noção' e participei de um dito centro espírita. Lá, os caras tinham uma foto de Jesus na parede que, por Deus, se olhasse bem de perto, dava para dizer que era a foto do Charles Manson. Eu dizia que ia ao Centro Espírita do Charles Manson, mas como o povão geralmente é burro demais e não sabe nem o nome do Papa direito, eles jamais desconfiavam sobre quem seria 'esse tal de Charles Manson'. Enfim, eu ia lá, e Iracema sempre me recebia bem, me punha sempre ao lado dela e do marido num lugar confortável. Eu, obviamente, já um louco experiente das estradas da vida, sabia que aquela hospitalidade toda não era só por 'espiritualidade' e 'jeitão de espírita'.
    Um dia, então, ela me convidou para ir até o escritório deles, que por sinal, ficava na casa do casal, uma baita casa, diga-se de passagem. Eu, como todo bêbado desocupado do mundo, sem nada de útil para fazer, fui, óbvio.
    Quer uma bebida? Um café, algo do tipo? Dizia ela, sempre sorridente tipo aquela galera dos anos 60, 'paz e amor aí, bicho'. Notei que ao lado da vasta estante de livros tinha umas bebidas, um uísque, vodka, charutos.
    Ela: Gilberto gosta de charutos, cubanos, os melhores, segundo ele.
    Eu: E onde está 'nosso amigo' Gilberto?
    Ela: Viajou para a capital, resolver umas coisas.
    Eu: Então, sendo assim, aceito um uísque.
    Ela, toda sorridente como sempre, vestindo uma espécie de camiseta que parecia um vestido branco por cima (camivestido ou vestidoseta), deixando à mostra seus seios médios mas apetitosos, e em sua calça Legging apertada até o fundinho mostrando bem o desenho por trás e o capuzinho de fusca por frente, foi caminhando lentamente em direção ao canto da sala onde ficava a cachaçada toda, com passos de mulher classuda, mulher fina, toda cheirosa, solta, leve, impondo um ritmo sensual no andar e no falar. Tudo para que eu pudesse apreciar aquele monumento de mulher com 53 anos de idade, mas que parecia se transformar de uma hora para outra numa menina de 23.
    Sentamos, e ela me acompanhando no uísque, puxou um baseado de um porta-cigarros prateado, fino. Gosta? Perguntou.
    Com uma mulher como você como companhia, fumaria qualquer coisa, beberia qualquer coisa, disse-lhe. Ela sorriu, e era um sorriso que deixava qualquer um mais duro que um aço.
    Um uísque aqui, outro cigarro de maconha ali, as horas foram passando e quando vi já eram quase 5 da tarde.
    Eu: É melhor eu ir andando, disse.
    Ela: Bobagem! Tem algo importante para fazer?
    Eu: Na verdade, nunca tenho nada de importante para fazer. Sou como Diógenes Laércio, o cão, só que não moro num barril com cachorros.
    Ela rindo: Temos alguns volumes de História da Filosofia aqui, li algumas coisas sobre Diógenes de Sinope. Um louco com muita razão, principalmente, sobre o desapego das coisas deste mundo. A única coisa foda é que eu nunca conseguiria viver sem as coisas que tenho, ainda mais num barril na praça pública.
    Ela ria, apaixonantemente. Que mulher! Então, lhe disse: Talvez o velho 'Dio' foi o único Filósofo de verdade, como 'F' Maiúsculo.
    Ela: Pode ser. Sabe, Robe, sou casada há 30 anos com Gilberto, jamais pensei em traí-lo.
    Eu, pensando comigo, essa pancada veio do nada, e disse-lhe: Olha, 'Cema', pode apostar que não tenho a intenção de desvirtuá-la.
    Ela rindo, relex pela Cannabis: Infelizmente, isso não será possível. Você já me desvirtuou.
    Eu: Como assim?
    Ela, sentada esticando a perna em minha direção, segurando o cigarro de maconha e sorrindo: Ah, vai dizer que, um homem como você, não notou a receptividade de uma mulher que você nunca viu antes, a atenção lhe dada, a forma rápida como viemos parar aqui?
    Eu: Confesso que, mesmo sendo um homem como você acha que eu sou, juro que não alimentei nenhuma expectativa ao vir aqui, a não ser beber e bater um papo, evitando, assim, ainda que por um curto espaço de tempo, o que alguns chamam de 'o vazio desolador causado pela ausência de sentido da vida'.
    Ela: Entendo que você queira ser cauteloso ou que talvez esse seja só mais um personagem seu, mas venhamos e convenhamos, cá estamos e o que você fez comigo, jamais achei ser possível em todos esses anos de um casamento sólido, com filhos e netos. Acho que fiquei maluca.
    Eu: Olha, Cema, vamos devagar com o Andor, não entendo o que quer dizer com "o que você fez comigo"?
    Ela: Nada, ainda, e é isso que me deixa mais louca.         
    Eu, percebendo a pira de Cema, como um prisioneiro louco para fugir, disse-lhe: Sei, sei.... Às vezes, fazer nada é mil vezes pior do que fazer alguma coisa.
    Ela: Essa é a psicologia do 'não contrarie a louca?'.
    Então levantei pegar mais uma dose de uísque, afinal, quem já está no inferno não custa abraçar a Dante, e lhe disse: Cema, seja lá o que se passa na sua cabeça, quero te dizer que não tenho nada a ver com isso e acho que você não deveria jogar em outra pessoa a culpa ou motivo por estar assim, 'indizível'. Mas, te digo: tô aqui para o que você precisar, ok?
    Cema bota a mão no rosto, e começa a chorar baixinho e diz: Desculpa, Robe, isso foi um erro mesmo. É muito difícil chegar a tal idade e sentir como se não tivesse vivido de verdade, mesmo tendo de tudo na vida, casa, carros, dinheiro, uma vida boa, confortável, entende? Existe vazio maior que esse?
    Eu: Acalme-se, mulher. Tem um autor desconhecido que li dia desses, e ele dizia: 'Não há atentado maior contra a vida do que uma vida fake'. Mas, nem tudo é fake na vida. Por exemplo, você mesma disse que tem uma vida ótima com suas coisas, já é avó, todos estão bem e a coisa toda vai de vento em popa, não é? Então, nem tudo se perdeu.
    Ela: Não estou falando disso, sou grata por tudo que a espiritualidade me deu. Me refiro à mim, mesmo sendo grata a tudo e me sentir bem com a vida que levo, não consigo mais me sentir bem comigo mesma, sinto que falta algo aqui dentro, como se tivesse um buraco em meu estômago, um buraco em meu coração, um buraco em minha alma, algo que não sei dizer, entende, Robe?
Já recomposta, após algumas lágrimas de crocodilo, ela se levantou e foi pegar mais uma dose de uísque. Encheu o copo dela, depois o meu e botou uma canção do Elvis Presley, Suspicious Minds, que em tradução livre diz:


"Caímos em uma armadilha
Não posso escapar
Porque eu te amo demais meu amor
Por que você não vê
O que está fazendo comigo
Quando você não acredita em uma palavra que eu digo
Não podemos continuar juntos
Com mentes desconfiadas
E não podemos construir nossos sonhos
Com mentes desconfiadas
Então, se uma velha conhecida amiga
Vier dizer olá
Será que eu ainda veria desconfiança nos seus olhos
Aqui estamos novamente
Perguntando por onde eu andei
Não vê que essas lágrimas são reais
Estou chorando
Não podemos continuar juntos
Com mentes desconfiadas
E não podemos construir nossos sonhos
Com mentes desconfiadas
Oh, deixe nosso amor sobreviver
Ou seque as lágrimas dos seus olhos
Não vamos deixar uma boa coisa morrer
No entanto meu amor, você sabe que
Eu nunca menti pra você
Caímos em uma armadilha
Não posso escapar..."
    E começou a dançar e a cantar alto e ela cantava lindamente bem. Era a mulher mais lindamente pirada que já tinha visto cantando Elvis. Então veio até mim, me abraçou e continuou a cantar baixinho: "Caímos em uma armadilha/Não posso escapar...", e, assim, em dois toques, me beijou e o incêndio que tanto ela tentava evitar se deu e, como Nero tocando fogo em Roma, só restava contemplar o caos do momento.
    Dentro dela, da mesma forma que senti sua carência e o fogo intenso de sua vida, senti o seu vazio, um vazio desolador. Depois, como completos estranhos, como se nada tivesse acontecido, voltamos para beber mais um pouco e conversar.
    Ela, melancolicamente: De que adianta ter tudo e não ter nada dentro de si?
    Eu: Como animais pensantes, todos temos um vazio, como um Buraco Negro. Essa singularidade cósmica interior nunca sumirá, nunca será preenchida totalmente, quer dizer, temos de conviver com esse vazio e toda a desolação que ele traz. É isso ou ser estraçalhado e aniquilado por ele, como os Planetas e Estrelas que são devoradas pelos Buracos Negros no espaço sideral.
    Ela: Sinto que estou prestes a ser engolida pelo meu próprio Buraco Negro, então.
    Eu: Você falando assim, parece que foi a pior transa da sua vida.
    Ela, rindo: Bobagem, estamos apenas 'filosofando'. É claro que gostei e muito. Aliás, nos últimos anos, as únicas coisas que me mantém longe da auto-extinção é a bebida, o sexo, isto é, até conhecer você, o desejo de sexo, a maconha e as apostas no jogo do bicho. Tudo, claro escondido, como uma autêntica vida fake tem que ser, para usar o pensamento que antes você citou.
    Rimos juntos. Então, lhe disse: Cema, de fato, sempre esperaremos que as coisas sejam muito melhores, mas, diz o ditado, temos de estar prontos para nos arriscar em busca dessas coisas ditas melhores e, acima de tudo, estar prontos para o pior, para as decepções. A vida poderia ser Aquilo se não fosse apenas Isso? E daí? Segue o jogo! Não é isso que vocês espíritas acreditam? Na continuação do jogo da vida?
    Ela: Sinceramente? Após vários anos frequentando aquilo lá, cheguei à conclusão de que só fico lá por causa do Gilberto e das ações sociais que fazem com que eu me sinta um pouco útil. O resto, parece tudo uma grande bobagem. Quando começam com aquelas coisas de 'vi espírito assim, sonhei com espírito assado', confesso que me seguro para não rachar de rir, tudo me parece muito surreal. Parece um bando de loucos alucinados, fanáticos. Muitos são gente boa, mas são muito alucinados. Desconfio que, como eu, o pessoal lá deve usar algum tipo de alucinógeno escondido.
    Eu: Na real? Toda forma de crença, sem exceções, é apenas um faz de conta, uma ilusão, uma mentira na qual as pessoas acreditam para seguirem com suas vidas sem desabarem de vez. Nada mais que isso. Todo mundo que acredita em alguma coisa, no fundo, sabe que é besteira. Isso não significa que não possa existir algo mais, afinal, quem somos nós para reduzir todo o Cosmos Incomensurável ao nosso miserável conhecimento humano? Penso que tudo está em aberto, mas dizer que, o outro mundo, se ele mesmo existir, 'é assim ou assado', é baboseira, pilantragem. Penso que, se existir mesmo o outro mundo, para cada um será diferente, conforme seu grau de compreensão da vida. Agora dizer exatamente como tudo será ou deixará de ser, como fazem os que acreditam nas próprias baboseiras, é muito tragicômico.
    Ela: Concordo, Robe. No entanto, eu acredito que haja algo mais, algo melhor que essa 'sofrência' toda, esse tédio todo aqui na Terra. Como eu queria ter conhecido você antes, Robe. Quem sabe, assim teria sido mais feliz?
    Eu: Duvido muito que você seria mais feliz se tivesse me conhecido antes.
    Ela, rindo ironicamente: Já casada conheci outros homens antes, mas nunca tive coragem de me deitar de fato com eles, no máximo foi uma conversa, uma bebida, um cigarro.
Eu: Sei...
    Ela: Tá bom, no máximo uns amassos, uma pegadinha aqui, uma chupadinha ali, mais nada...
    Eu: Sei...
    Ela, rindo: Tá bom, Robe. Conheci apenas dois caras em todo esse tempo, dormi com eles, mas eles só queriam meter, meter, meter, não se davam sequer ao trabalho de propiciar uma bela preliminar, não tinha um papo tão bom como o seu, e para falar a verdade, não tinham essa bela e grande ferramenta que você tem e que sabe usar com maestria.
    Eu: Sei...
    Ela ainda sorrindo: Sério, a maioria dos homens podem até ter uma ferramenta tão grande quanto a sua, mas não sabem usá-la, nem ao cérebro. Só querem saber de botar pra dentro, depois saem correndo como o diabo foge da cruz. Não conversam feito gente, não fazem um carinho, não demonstram gratidão, não olham nos olhos como você faz. De fato, foram poucos os homens que encontrei na vida que me olharam nos olhos, principalmente, quando falava com eles. Nem meu marido me olha nos olhos direito, só lá de vez em quando, como todo o resto, 'só lá muito de vez em quando'.
    Eu: Minha cara Cema, o papo está ótimo mas acho melhor me mandar, afinal, vai que o Gilbertão chega e aí, pode ser embaraçoso.
    Ela: Vai nada, ele ficará na capital até amanhã à tarde. Ademais, eu disse que você viria ver uns livros e jantar aqui. Ele não liga. Acho até que, no fundo, ele sabe o que de fato acontece aqui e agora, mas não liga, desde que eu esteja contente.
    Eu: É louco isso, mas não é a primeira vez que ouço coisa do tipo.
    Ela: É mesmo?
    Eu: É, já conheci mulheres casadas, que também tinham dramas semelhantes, com o devido respeito.
    Ela: Imagino. Na verdade, acho que todo casamento chega num ponto que sem uma puladinha de cerca, uma coisa por fora, não sobrevive. Claro, não sou promíscua, sempre busquei alguém fixo, sério, companheiro, amigo, confidente, alguém para me sentir viva, seja no sexo, seja na vida, no dia a dia, além do casamento. Observe bem, além e não fora. Jamais deixaria Gilberto, mas como ele já está velho, cansado, quase 70 anos já, portanto, quase 18 a mais do que eu, eu sinto a necessidade não apenas de um marido, mas de um homem. Gilberto nunca gostou muito de sexo e eu sempre fui mais afim, inclusive, quando mais jovem, queria quase todo dia e ele, coitado, teve que se virar. Aí vieram os filhos, depois netos e agora, cá estamos, na encruzilhada da vida.
    Eu: Compreendo-te. A maioria das mulheres casadas que conheci, algumas acima dos 40, também sentiam muito a necessidade de sexo e não eram correspondidas pelos maridos que tinham amantes mais jovens ou já não davam mais no couro, como diz o povão.
    Ela rindo suavemente, enquanto tomava seu uísque e fumava seu cigarro comum, desta vez, disse: Não é só sexo, é o sexo mas algo mais, um bom papo, ser vista, observada. Desde que você chegou aqui, além de um bom papo, agradável, além de me olhar nos olhos, notei que você me observava de cima a baixo, e isso me fez me sentir desejada, querida, em todos os sentidos, como já há muito não era. Já foi casado?
    Eu: Não, nunca.
    Ela: Já teve filhos?
    Eu: Nunca. Não que eu saiba.
    Ela: Então, é um Lobo solitário, Robe?
    Eu, sorrindo: Lobo, não sei, solitário talvez, mas sozinho, sozinho, nunca.
    Ela também ri e diz: Se percebe pela tua experiência com as mulheres.
    Eu: A maior e mais difícil faculdade da vida é a Mulher, o Mistério dos Mistérios, o desafio dos desafios. Sem a Mulher, o Homem jamais teria saído da Idade da Pedra, muito embora muitos tenham saído da Idade da Pedra e a Idade da Pedra não tenha saído deles.
    Ela, sorrindo como sempre, diz: Concordo. Algumas são mais desafiadoras que as outras. Tenho amigas casadas que saem com qualquer um que lhes dê na cabeça. Elas dizem sofrer, comumente, de um 'tédio profundo' em seus casamentos, mas também não abrem mão dos maridos, por mais que a coisa toda já tenha ido pro brejo em termos de Cama. Uma delas, Mérida, me disse que, no começo, ela tinha medo de ser pega, mas depois de um tempo, vendo que o marido também dava suas escapadas, sobretudo, vendo que ele nem dava bola para onde ela ia, com quem estava e o que fazia, parou de se preocupar e hoje sai com muita tranquilidade, claro, muito sigilosamente, mas muito tranquila, e assim, segundo ela, aproveita muito mais e goza muito mais gostoso. Em casa, diz ela, rola um acordo sem tocar no assunto, como entre dois aliados que nem precisam se reunir contra um inimigo em comum 'o tédio' e a mesmice que a passagem dos anos impõe.
    Eu: O tédio é mais perigoso que muitas coisas e pode ser a porta para uma porrada de coisas.
    Ela: Não é mesmo? Algumas amigas, jocosamente, dizem que Eva, estando profundamente entediada, mesmo sabendo da proibição, esdrúxula, sobre 'não comer a maçã encantada', resolveu comê-la mesmo assim e dar o caroço para Adão, o bobão, só para sair daquela 'bolha' que era o Éden. Eva, portanto, conheceu o 'Tédio Divino' e achou um jeito de se livrar dele, do Tédio, sem abrir mão de Adão, ainda que bobão.
    E rimos juntos, muito, demoradamente. Até nos aproximar e nos pegar com fogo e com força, novamente. Como já tínhamos bebido bastante e Iracema fumado vários cigarrinhos de Cannabis, pensei que seria coisa rápida, mas não, foi deliciosamente demorada, num mergulho surreal ao prazer. Em certo momento, ela cavalgando loucamente, possuída de tesão, me diz: me bate!
    Eu: O quê?
    Ela: Me dá uns tapas na cara.
    E enquanto eu fiquei reticente, pensando naqueles micro-segundos, ela pegou uma de minhas mãos, chupou meu dedo e se esbofeteou usando a minha mão e disse novamente: Por favor, Robe, me dá uns tapas, vai...
    Então, lhe dei uns tapas, de leve...
    E ela, louca de prazer, toda molhada sobre mim, tornou a dizer: Me bate mais forte e me chama de puta, me xinga, vai...
    E então, obedecendo a seus pedidos, dei-lhe mais uns tapas no rostinho lindo e na sua deliciosa bunda, dizendo-lhe: Tá gostando, sua puta?
    Era surreal o tesão que nos tomava, e ela disse: Isso Robe, safado, fode gostoso, mete atrás vai, fode rápido e com força, me enche de leitinho, vai, soca tudo, tesudo.
    E foi mesmo surreal. Maravilhosamente surreal. Perdoem as expressões pesadas, mas isso aqui é um relato filosobólico, que trata da vida nua e crua, fodástica como ela, engraçada e tosca como ela também é e não um livrinho de catequese. Ademais, quem nunca gozou na total sacanagem, entregue ao prazer, sobretudo querendo e gostando, nunca viveu de verdade e, portanto, também por isso, vive uma vida fake.
    Depois disso, apagamos e quando acordamos já era quase onze da noite. Cema levantou e disse: Vou tomar uma ducha, quer vir junto?
    Eu: Não, não. Vai lá, depois eu tomo uma ducha. Ela foi e se demorou. Ao voltar, deitou ao meu lado e disse-me: Robe, Você não me achará uma puta louca, achará?
    Eu, pensando comigo, 'quase toda mulher, principalmente, a casada, depois de uma sessão de sexo com total sacanagem, passado o tesão, cai num dilema moral fodido e ficam perguntando quase sempre a mesma coisa'. Respondendo a ela, então, disse-lhe: Sabe, Cema, diz o povão, 'se não podia, por que que veio?'. Quer dizer, é claro que jamais pensaria uma coisa dessas de ti. Perdoe-me a falta de vergonha na cara, mas eu conheço puta louca, e você não é uma.
    Ela rindo, malandramente: E como é uma puta louca de verdade?    
    Eu rindo levemente inculcado, mas nada surpreso com a curiosidade, sempre presente, disse: é puta e louca, na cama e na vida. Não rasga nada, e se comporta da mesma forma em toda a parte, quase sempre. Entende?
    Ela sorrindo malandramente, como sempre, cheia de piadinhas, disse: Entendi. Então, a puta louca de verdade é puta em tempo integral e mulheres como eu, são putas na cama e damas na sociedade, ou seja, somos putas em meio período.
    Eu acariciando sua vagina, de banho tomado, por demais cheirosa, ironicamente, asseverei: É por aí...
    Ela, massageando meu membro já todo duro novamente, mas sem tomar banho ainda, disse-me: Então, deixa eu ser a sua puta mais uma vez, e assim, mamou e sentou em cima novamente. Cema gostava que fizesse dentro dela e a posição que mais gostava era de frente, comigo mamando em seus seios lindos, socando até o fundo, e jorrando dentro dela, como um cavalo.
    Já eram quase duas da madrugada, Cema estava desmaiada na cama, apagada. Vesti minha roupa, tomei mais uma bela dose do uísque caro, voltei ao quarto, a cobri e lhe dei um beijo na testa. Encostei a porta do quarto, peguei dois livros na estante, sentei no sofá da sala, e comecei a ler. O primeiro era um compêndio de Poemas de Fernando Pessoa, que ele jurava ser de uma de suas criaturas chamada Álvaro de Campos. O texto, chamado: Eros e Psiquê, dizia assim:
"Eros e Psiquê
(...E assim vêdes, meu Irmão, que as verdades que vos foram dadas no Grau de Neófito, e aquelas que vos foram dadas no Grau de Adepto Menor, são, ainda que opostas, a mesma verdade. )
(Do Ritual Do Grau De Mestre Do Átrio Na Ordem Templária De Portugal)
Conta a lenda que dormia
Uma Princesa encantada
A quem só despertaria
Um Infante, que viria
De além do muro da estrada
Ele tinha que, tentado,
Vencer o mal e o bem,
Antes que, já libertado,
Deixasse o caminho errado
Por o que à Princesa vem.
A Princesa Adormecida,
Se espera, dormindo espera,
Sonha em morte a sua vida,
E orna-lhe a fronte esquecida,
Verde, uma grinalda de hera.
Longe o Infante, esforçado,
Sem saber que intuito tem,
Rompe o caminho fadado,
Ele dela é ignorado,
Ela para ele é ninguém.
Mas cada um cumpre o Destino —
Ela dormindo encantada,
Ele buscando-a sem tino
Pelo processo divino
Que faz existir a estrada.
E, se bem que seja obscuro
Tudo pela estrada fora,
E falso, ele vem seguro,
E vencendo estrada e muro,
Chega onde em sono ela mora,
E, inda tonto do que houvera,
À cabeça, em maresia,
Ergue a mão, e encontra hera,
E vê que ele mesmo era
A Princesa que dormia."
    Após ler aquilo, pensei comigo, não é possível que Fernando Pessoa usasse apenas a bebida para escrever, devia ter algum alucinógeno na jogada, porque o cara viajava mesmo e escrevia para caralho. Refletindo sobre o poema, pensei comigo, imagina se, muitas das mulheres que conheci, não eram putas loucas e eu é que sempre fui o putão louco? Que doideira, ein? Mas, a verdade, na realidade, é bem outra, felizmente para alguns e infelizmente para outros. Gosto de Fernando Pessoa, sobretudo, porque, ao meu ver, ele morreu como um herói dos perdidos do mundo, com cirrose mas fazendo aquilo que mais gostava, escrever e beber, sem medo de ser feliz, muito embora a mim me pareça, que ele sofria dos mais pesados dos males, a solidão combinada com a ideia de total ausência de sentido da vida. Claro, os teóricos idealistas, idólatras, fãs e beatos devotos de 'São Autor', dizem que Pessoa não morreu de Cirrose mas de "Pancreatite aguda", que o Almada Negreiros o imortalizou bebendo café e que, por isso, sobretudo, pela vasta obra escrita, com a criação de mais de 130 'marionetes' como o Álvaro de Campos, Pessoa, grande consumidor de Absinto, Ópio e tudo mais, jamais poderia ter morrido de Cirrose. No mundo da Lua da idolatria e da idealização, vale tudo para manter uma moral que nem o autor fazia questão de cultivar, intacta. Os beatos de Fernando Pessoa, se negam a aceitar e consideram uma verdadeira heresia dizer que ele era bêbado, como muitos outros grandes nomes da humanidade. E que mal há em ser bêbado? Mal há em ser genocida, tirano, ladrão do dinheiro do povo, rico corruptopata, político politicopata, religiopata, fanático e outros tipos de estelionatários da vida. Não é? Babacas, são todos os teóricos e leitores bajuladores que tentam pintar um autor como santo, impecável e, pior, fazer dele um guru eterno. Não existe filhadaputagem e babaquice maior que querer tolher o autor, seja ele qual for, dos defeitos naturais de sua humanidade, isto é, de seus podres, vícios, delírios, complexos, imperfeições, excessos e insanidades. Quem age assim, na intenção bizarra de preservar uma pretensa moral ilibada que beira à santificação santarrona, tira o que o autor tem de melhor, que são os seus defeitos. Nota de memória mental: 'nunca confiar em que escreve livros ou quaisquer outros tipos de textos puxando saco de autores e os colocando num altar'.
    Já eram quase três da madrugada, levantei do sofá para ver Cema, e ela estava lá, desmaiada, dormindo com aquele bundão maravilhoso para cima. Deixei-a em paz, voltei pro uísque, um cigarro e para ler alguma coisa de um outro livro. Sentei no sofá, peguei-o e comecei a passar as páginas, para frente e para trás, sem compromisso. Era o livro: "Breviário de Decomposição" do igualmente Ébrio e Vagal, E.M Cioran. Abro uma página qualquer e leio o seguinte trecho:
    "Cada um de nós nasceu com uma dose de pureza, predestinada a ser corrompida pelo comércio com os homens, por esse pecado contra a solidão. Pois cada um de nós faz o impossível para não se ver entregue a si mesmo. O semelhante não é fatalidade, mas tentação de decadência. Incapazes de guardar nossas mãos limpas e nossos corações intactos, nos sujamos ao contato de suores estranhos, chafurdamos sedentos de nojo e entusiastas de pestilência na lama unânime. E quando sonhamos mares convertidos em água benta, é tarde demais para mergulharmos neles, e nossa corrupção demasiado profunda nos impede de afogar-nos ali: o mundo infectou nossa solidão; as marcas dos outros em nós tornam-se indeléveis. Na escala das criaturas, só o homem pode inspirar um nojo constante. A repugnância que provoca um animal é passageira; não amadurece no pensamento, enquanto que nossos semelhantes inquietam nossas reflexões, infiltram-se no mecanismo de nosso desapego do mundo para nos confirmar em nosso sistema de recusa e de não adesão. Depois de cada conversa, cujo refinamento indica por si só o nível de uma civilização, por que é impossível não sentir saudades do Saara e não invejar as plantas ou os monólogos infinitos da zoologia? Se com cada palavra obtemos uma vitória sobre o nada, é apenas para melhor sofrer seu domínio. Morremos em proporção às palavras que lançamos em torno de nós.... Os que falam não têm segredos. E todos nós falamos; nos traímos, exibimos nosso coração; carrasco do indizível, cada um esforça-se por destruir todos os mistérios, começando pelos seus. E se encontramos os outros, é para aviltar-nos juntos em uma fuga para o vazio, seja no intercâmbio de ideias, nas confissões ou nas intrigas. A curiosidade não só provocou a primeira queda, como as inumeráveis quedas de todos os dias. A vida não é senão esta impaciência de decair, de prostituir as solidões virginais da alma pelo diálogo, negação imemorial e quotidiana do Paraíso. O homem só deveria escutar a si mesmo no êxtase sem fim do Verbo intransmissível, forjar palavras para seus próprios silêncios e acordes audíveis apenas a seus remorsos. Mas ele é o tagarela do universo; fala em nome dos outros; seu eu ama o plural. E o que fala em nome dos outros é sempre um impostor. Políticos, reformadores e todos os que reivindicam um pretexto coletivo são trapaceiros. Só a mentira do artista não é total, pois só inventa a si mesmo. Fora do abandono ao incomunicável, da suspensão no meio de nossos arrebatamentos inconsolados e mudos, a vida é apenas um estrondo sobre uma extensão sem coordenadas, e o universo uma geometria que sofre de epilepsia".
    Cioran, é, praticamente, um dos precursores do pensamento do tipo 'era melhor não ter nascido', que depois vira coisa do tipo 'eu não pedi para nascer', ao dizer simplesmente, que: “não estamos correndo para a morte, estamos fugindo da catástrofe do nascimento”. Ele é um sujeito que, na sua juventude, admirou Adolf Hitler mas depois 'se arrependeu' e, ironicamente, se assumiu vagabundo, confessando que se matriculou na Sorbonne, na França, só para comer de graça na cantina. Ele gosta muito do termo "Cada um de nós" e também gosta de associar a ideia de suicídio como salvadora, inclusive de si mesmo, e diz que a ideia de suicídio está intimamente ligada à liberdade. "A vida é apenas um estrondo". E que estrondo, não é mesmo? Cioran, no entanto, defensor da ideia de suicídio como um ato de liberdade, portador da doença de Alzheimer, morreu aos 84 anos. Antes, muito antes, após se arrepender de ter admirado Hitler e a mística Nazista, ele chega a dizer que 'O Fanatismo é uma espécie de tara, da qual só escapam os céticos, os preguiçosos e os estetas porque não propõem nada, porque verdadeiros benfeitores da humanidade, destroem os preconceitos e analisam o delírio'.
    O texto original, diz, ipsis litteris: [...] "No momento em que nos recusamos a admitir o caráter intercambiável das ideias, o sangue corre... Sob as resoluções firmes ergue-se um punhal; os olhos inflamados pressagiam o crime. Jamais o espírito hesitante, afligido pelo hamletismo, foi pernicioso: o princípio do mal reside na tensão da vontade, na inaptidão para o quietismo, na megalomania prometeica de uma raça que se arrebenta de tanto ideal, que explode sob suas convicções e que, por haver-se comprazido em depreciar a dúvida e a preguiça – vícios mais nobres do que todas as suas virtudes –, embrenhou-se em uma via de perdição, na história, nesta mescla indecente de banalidade e apocalipse... Nela as certezas abundam: suprima-as e suprimirá sobretudo suas consequências: reconstituirá o paraíso. O que é a Queda senão a busca de uma verdade e a certeza de havê-la encontrado, a paixão por um dogma, o estabelecimento de um dogma? Disso resulta o fanatismo – tara capital que dá ao homem o gosto pela eficácia, pela profecia e pelo terror –, lepra lírica que contamina as almas, as submete, as tritura ou as exalta... Só escapam a ela os céticos (ou os preguiçosos e os estetas), porque não propõem nada, porque – verdadeiros benfeitores da humanidade – destroem os preconceitos e analisam o delírio. Sinto-me mais seguro junto de um Pirro do que de um São Paulo, pela razão de que uma sabedoria de boutades é mais doce do que uma santidade desenfreada. Em um espírito ardente encontramos o animal de rapina disfarçado; não poderíamos defender-nos demasiado das garras de um profeta... Quando elevar a voz, seja em nome do céu, da cidade ou de outros pretextos, afaste-se dele: sátiro de nossa solidão, não perdoa que vivamos aquém de suas verdades e de seus arrebatamentos; quer fazer-nos compartilhar de sua histeria, de seu bem, impô-la a nós e desfigurar-nos. Um ser possuído por uma crença e que não procurasse comunicá-la aos outros é um fenômeno estranho à terra, onde a obsessão da salvação torna a vida irrespirável. Olhe à sua volta: por toda parte larvas que pregam: cada instituição traduz uma missão; as prefeituras têm seu absoluto como os templos: a administração, com seus regulamentos – metafísica para uso de macacos... todos se esforçam por remediar a vida de todos; aspiram a isso até os mendigos, inclusive os incuráveis: as calçadas do mundo e os hospitais transbordam de reformadores. A ânsia de tornar-se fonte de acontecimentos atua sobre cada um como uma desordem mental ou uma maldição intencional. A sociedade é um inferno de salvadores! O que Diógenes buscava com sua lanterna era um indiferente". [...]
    Quase quatro da manhã, uma paulada dessas na cabeça. Como dormir após um encontro incendiário com uma mulher maravilhosa sem pudor e uma breve leitura sobre Fernando Pessoa e E.M Cioran? Nunca mais dormirei, exceto quando meu corpo não suportar mais o bom cansaço, seja do ótimo sexo, seja da boa bebida.
    Enquanto pensava e lia mais coisas, Cema se levantou, atordoada, descabelada, mas linda, como sempre. Veio e deitou-se entre minhas pernas, encostando sua cabeça em meu peito e lá ficamos até o amanhecer, como jovens namorados. Mas, como tudo que é bom uma hora acaba, a manhã veio e com ela a necessidade de ir embora. Levantamos, conversamos um pouco mais, nos beijamos e nos despedimos. Ela estava cansada, mas contente. Quanto a mim, pensamentos de todos os tipos vinham e se mandavam. Era quase 9 da manhã, passando pela frente do bar do Zelão, resolvi chegar para tomar um café. Café? Foda-se, quem já está no inferno, não custa nada abraçar a Dante e Virgílio. Pedi logo uma garrafa de cerveja. Afinal, como diz o próprio Cioran: "Quem levanta pela manhã tem a ilusão de começar alguma coisa. Mas se você passa acordado a noite toda, você não começa nada."    
    Pois bebi aquela garrafa de cerveja sem falar com Zelão direito porque estava imerso em pensamentos e ele estava ocupado recebendo mercadorias. Bebi, paguei e me mandei para o cafofo. Cheguei, dei comida para o cão Diógenes, deitei de roupa e tudo, me virei para o lado e apaguei, mesmo jurando que jamais dormiria novamente. Promessas são feitas para serem quebradas e não mantidas. O sono dos heróis da resistência, invisíveis e perdidos do mundo.
    Após aquela noite, Cema quis me ver mais vezes e até marquei com ela. Num dia marcado, estava num escritório de advocacia de um amigo, bebendo vinho e falando sobre as teorias da força do direito contra o direito da força, uma pura perda de tempo. Ela estava a caminho e mandando mensagem: 'estou chegando'. Naquele dia, Gilberto, o marido já estava na cidade e ela queria ir a um motel. Eu a vi chegando, mas na hora de me levantar da cadeira para ir até ela e termos uma tarde de sexo sem limites, algo me disse: 'é hora de parar. Como assim? É, isso mesmo, a hora de parar'. Claro, esse algo era eu mesmo dizendo a mim mesmo. A coisa estava ficando muito 'apegada' e nunca fui adepto de apego algum, a nada e a ninguém. Então, não respondi mais nada. Ela apenas ficou lá no carro, esperando. Mas, após uma meia hora, ela foi embora e eu apenas a vi, de soslaio, dobrando a esquina em seu carro importado. Depois disso, nunca mais a vi. Apenas soube que estava de volta ao Centro Espírita atendendo pessoas carentes como que uma forma de 'se livrar' dos pecados ou 'do mal', ambos cometidos naquela tarde e noite de sexo sem limites. Um tempo depois, soube que Gilberto bateu as botas aos 70 anos de idade. Na época, até tentei contactá-la para prestar minha solidariedade, mas ela simplesmente me bloqueou em todas as redes sociais. Não existe ser mais vingativo do que uma mulher magoada. Uma mulher casada magoada com o amante é mil vezes mais vingativa e a pior vingança de uma mulher é bloquear acesso ao seu coração. Alguns dirão: "mas e o homem safado que se apaixona pela amante?". O homem safado, principalmente, o casado, perde tudo, família, mulher, carro, casa, dinheiro, se lasca para valer e, certamente, muitos fazem merda. Quer dizer, não tem santinho na história quando as coisas do coração dão erradas, a crise se instala, a briga é certa, o inferno astral prevalece, o caos é o que resta. Contudo, acredite ou não, tudo passa, o que é bom e também o que é ruim, tudo é passageiro, efêmero e secundário diante da incomensurabilidade cósmica. Cema já estava viúva mas ainda sim se sentia casada e achava, segundo soube por terceiras, amigas dela com quem sai mais tarde, que eu era o louco que a desvirtuou e, por se sentir culpada de alguma maneira, por trair a confiança de Gilberto, jamais poderia me perdoar. Depois de vários anos, soube que ela se juntou com uma mulher que conheceu num balei e decidiu viver um amor lésbico. Sorte para ela, não é?
    Não é fácil sair da zona de conforto, principalmente, da zona de conforto moral, de certo errado, bem e mal, bom e mau, santo e pecado, sobretudo ainda, quando se alimenta muitas expectativas e falsas expectativas em relação ao novo mundo explorado e a pessoas que se conhece nesse novo mundo louco. Quando se tenta voltar para a zona de conforto conhecida, um turbilhão de sentimentos, ressentimentos e o remorso toma conta da pessoa, ainda mais se ela tiver um ponto fraco religioso, a levando culpar e condenar o outro, isentando e inocentando a si mesma, se auto-declarando a vítima da história. Contudo, uma vez ultrapassada a linha para fora da zona de conforto, nunca mais se volta ao 'normal', por mais que se mate de tentar. Dali em diante, tudo é possível, para o bem e para o mal. É por isso que muitos seguem vivendo uma vida fake. Lamentavelmente, a maioria das pessoas, preferem criar uma versão má e sofrida da história e só veem esse lado ruim e sofrido, muitas vezes, se privando do bem que também há no caos, se privando de tentar viver de outro modo, desconsiderando e deixando passar batido o favor que os outros fizeram para elas ao abrirem a porta da prisão mental. Resumindo, por mais bem que você faça a alguém, cedo ou tarde, esse alguém, por fraqueza de espírito, alienação, religiopatia, moralice, ódio, inveja, tesão reprimido, ressentimento ou qualquer outro motivo, vai pegar esse bem, limpar a bunda, jogar na privada e dar a descarga.

Suicídio

    E assim, os anos foram se passando com a rapidez de uma tartaruga de Galápagos. Como diria, Moemar Szyslak (Moe), 'há coisas das quais não me orgulho e coisas que não faço questão de lembrá-las'. Mas, no geral, até que não foi tão ruim. Teve momentos que parecia o fim e agora que, com a idade, o fim se aproxima de fato, dá até vontade de viver, não uns 300, mas uns 10 ou 20 anos a mais.
    Em mais um sábado levanto cedo, abro a geladeira velha, tomo o resto da cerveja que deixei aberta na noite anterior, fumo um cigarro, dou comida para Diógenes, visto a roupa 'lavada', jogada na água com amaciante e sabão em pó, que secava no varal de fora da janela do cafofo e me mando para o reino encantado do Zelão/Seu Djair.
    Seu Djair, que está amassando o famoso bolinho de carne, vem me cumprimentar e diz: Bom dia, meu amigo Robe? Como é que vai essa força? Faz tempo que não te vejo ein?
    Eu: Bom dia Seu Djair, pois é! Correrias da vida, o senhor sabe como é. Mas estamos aí, lutando como um Leão pra não morrer como um Veado, mais firme que palanque no banhado.
    Seu Djair: 'É bão tamém!'. E as novidades?
    Eu: As novidades é que só se fala de um vírus que surgiu lá na China, o senhor viu só?
    Seu Djair: Pois é rapaz, é mais uma propaganda do caos isso daí. Querem matar o povão e reduzir a população mundial a qualquer custo, seja pela fome, miséria, seja por guerra, seja por um vírus. Se duvidar, se conseguissem pegar um meteoro e jogar na Terra, é bem capaz que o fizessem.
    Eu: Concordo Seu Djair. Daqui para frente, a tendência é de dar muita merda nesse mundo, não é mesmo?
    Seu Djair: Nem fale, homem do céu! 'Ce' acredita que um sobrinho da irmã da minha 'muié' se matou?
    Eu: Capaz? Foda ein?
    Seu Djair: Verdade, o rapaz de 25 anos, deu um tiro na boca. Não deixou carta, nem nada. E o pior de tudo, segundo os pais, ele parecia normal, meio triste às vezes, mas nada anormal, que saltasse aos olhos. Tinha sido pai recentemente, estava procurando emprego, mas a família deles é bem de vida, e, enfim, não tinha nada, à princípio que o levasse a tirar a própria vida.
    Eu: É, Seu Djair, todos nós podemos ser uma bomba relógio e não sabemos.
    Seu Djair: É verdade, Robe. A mãe, advogada, disse que uns dias antes ele foi pedir pra ela arranjar um emprego no prédio onde ela e os sócios tem vários escritórios, nem que fosse de zelador. E a 'muié', disse para o rapaz: 'cê tá louco? Você é um cara formado, pode pegar um emprego bom em qualquer lugar, eu não vou arrumar nada para você aqui, se você gosta de se humilhar, procure outro lugar e não aqui'. E daí, diz o povo que conhece eles, que o rapaz teria dito pra mãe: 'tá bom, tá certo, você tem razão'. E saiu. O pai o encontrou na saída da casa, e disse que lhe deu um abraço e o convidou para ir jantar na sexta, e o rapaz disse que iria. Mas, na quinta à noite, a polícia chegou na casa deles e contou: 'olha, seu filho foi encontrado morto dentro do carro, perto da represa e pelo jeito ele se suicidou'.
    Eu: Foda ein!
    Seu Djair: Nem fale, aí foi aquele desespero. Rapaz novo, cheio de vida pela frente, família bem de vida, mas, vai saber o que se passa na cabeça das pessoas, não é mesmo?
    Eu: É seu Djair, vivemos um mundo cão, insano, bizarro, macabro, onde quase todo mundo é uma ilha querendo ser mais ilha que os outros. Quase ninguém mais conversa feito gente, ninguém ouve o outro, ninguém tem tempo para bater um papo, ninguém quer estender a mão de fato. Enfim, como disse antes, todos nós podemos ser uma bomba-relógio e nem desconfiamos disso. Qualquer coisinha mal resolvida pode detonar a bomba e levar tudo pelos ares. E, na maioria das vezes, um mínimo de conversa e compreensão, podem evitar uma tragédia. E veja, segundo as estatísticas mundiais, mais cerca de quase 1 milhão de pessoas se suicidam todos os anos, isso é o que é registrado, louco não é?
    Seu Djair: Barbaridade, né Robe? Às vezes é falta de Deus no coração, você não acha?
    Eu: Pois olha Seu Djair, pode ser também falta de Deus no coração de quem deveria ouvir, conversar, estender a mão, ajudar a pessoa a compreender a situação, ampará-la e ajudá-la a encontrar uma solução, mostrando que a vida é dura para todos, em todas as classes e idades, que esse mundo é um mundo cão para todos e que, por mais foda que seja a vida em alguns momentos, não temos escapatória senão enfrentar o que tiver de ser enfrentado e aceitar o que tiver de ser aceito. Acho que falta compreensão de parte a parte. Mas, parece que a maioria esmagadora da humanidade já está podre de mente, coração e alma e nem liga para o oceano de desgraças no qual está, à deriva, não é mesmo?
    Seu Djair: Pois sabe que você pode ter razão! Por isso que aqui no bar nós damos ouvidos a todo mundo, até para o mais sarna dos bêbados.
    Eu: O que acontece na nossa mente, loucos que somos, já é um grande mistério, o que acontece na mente de uma pessoa com problemas psicológicos, então, é uma Galáxia de Mistérios. O que você faz com os sentimentos e pensamentos, principalmente, os pensamentos ruins que, aparentemente não são seus, são alheios a você, mas que brotam em sua cabeça, 'do nada', mesmo contra a sua vontade? Essas, talvez sejam questões de suma importância para os estudiosos e profissionais da mente, não é?
    Seu Djair: É, meu amigo Robe, certo é o ditado que diz que "cabeça vazia é oficina do Diabo". Todo mundo tem seus problemas, todo mundo fica triste, com ou sem dinheiro, todo ser humano nesse mundo, acredito eu, tem seus maus momentos. A vida é um sobe e desce de emoções, sentimentos, pensamentos, bons, ruins, meia boca, engraçados, idiotas e isso tudo ocorre com todo o ser vivente nesse mundo, da hora nasce até a hora que morre, da hora que deita para dormir, muitas vezes sonhando, até a hora em que acorda. Eu, Robe, quando tenho algum tipo de pensamento ruim, procuro logo me livrar dele me distraindo com uma dose de conhaque, batendo um papo com um amigo como você, lavando uma louça, assistindo alguma coisa, vendo a mulherada bonita que passa aqui na frente, enfim, faço alguma coisa. Mas, a maioria das pessoas, pelo que a gente vê, deixam as ideias ruins tomarem forma e força e quando menos percebem, já fizeram merda. O segredo é se livrar do pensamento ruim, na primeira vez que ele der as caras, senão, se fode mesmo.
    Eu: É a mais pura verdade seu Djair! Concordo plenamente com o senhor, até acho que o senhor pode dar aulas para muitos psicólogos por aí.
    E rimos, como bons velhos amigos, batendo um bom papo num sábado de verão, quente e luminoso. Era um daqueles dias loucos que não voltam mais e se perdem no turbilhão do tempo. Seu Djair seguiu fazendo os bolinhos e eu segui bebendo minha cerveja. A vida é assim, como uma loteria, às vezes temos sorte, às vezes não. Nós apenas seguimos apostando. Tempos depois, após a maldita pandemia mundial do vírus chinês, Seu Djair bateu as botas aos 74 anos. Mais uma grande e triste perda.
 
Viver também é perder tudo

    Seja como for, viver também é ter plena certeza de que, cedo ou tarde, você perderá tudo. Quem você ama, as coisas que você possui, os bichos de estimação, os livros, os poucos amigos, a beleza, a grana, a libido e, especialmente, a sua mais absoluta certeza e a sua mais sincera fé no mundo e nas pessoas. E por fim, você perderá a si mesmo antes de perder o seu sopro de vida. Durante muitos anos refletindo muito sobre isso tudo, no turbilhão insano que é viver nesse mundo cão, chego à conclusão que todo mundo tem ódio e amor no coração. Não tem como não odiar certas coisas, como também, não há como não amar certas coisas. E, nesse agora, penso que meu ódio em relação a algumas coisas desse mundo, principalmente, em relação a algumas pessoas dessa humanidade idiotizada, gadizada e desumanizada, poderia ter me consumido não fosse o desapego de quase tudo e, acima de tudo, o amor, essa coisa louca, incomensurável e inefável. Meu ódio, minha revolta e minha indignação nunca foram maiores que o meu tesão pela vida e o meu amor insano, imperfeito, sigiloso, silencioso e sincero pela vida e por aqueles poucos que valem a pena e por tudo que eu venero. Portanto, chego à conclusão de que não temos outra saída senão ser de verdade, principalmente, diante de nós mesmos, doa a quem doer, incomode quem incomodar. Não podemos negar o caos, a hediondez e o mal que impera nesse mundo cão e que, muitas vezes, também nos tomam pela ira, porque se assim o fizermos, negando que somos ao mesmo tempo, luz e trevas, estaremos afundando, irreversivelmente, numa vida fake e, pior, na robotização da humanidade desumanizada. Não há outra saída senão praticarmos o desapego de tudo, de todos e de nós mesmos, à medida que aumentamos o nosso tesão e o nosso amor pela vida e os fazemos triunfar sobre todo o ódio, revolta, vazio, medo, terror, ausência de sentido, desolação, solidão, ansiedade, desespero e desesperança, enquanto caminhamos para O Desconhecido dos desconhecidos, como autênticos Viajantes da Luz na Escuridão. Fim
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Poema-pensamento: Viva para sempre!
A v­­­ida é bela
Muda a todo o momento e há infinitas possibilidades
Mas também é fria
Dura
Implacável
Mortal
Para todos
Em todas as classes e idades

Uma decisão bem tomada pode construir impérios
O menor dos erros pode destruir civilizações

A vida é linda
Mas não se engane
Não vacile
Neste mundo há corações boníssimos
Mas também há muitos corações malignos
Alguns estão mais perto do que você possa imaginar

Viva esperto
Trabalhe pelo melhor
Torça pelo melhor
Mas não espere nada de ninguém
Nunca ache que merece
Porque ninguém merece, até que prove
Não espere nada desse mundo
Exceto dos cachorros e gatos
Deles você pode esperar algo sincero

Dê seu máximo
Seja sempre o melhor de você mesmo
A sua melhor versão
Seja você mesmo
Seja de verdade

Tenha coragem de usar o seu conhecimento
Aja pelo melhor
Torça pelo melhor
Espere pelo pior
De preferência, com um sorriso no rosto
Ainda que um sorriso insano, só para disfarçar
Esteja sempre pronto para o pior
Assim, o que vier de bom é lucro

Nada supera a grandeza das pequenas coisas da Vida
A vida é maravilhosa
Mas não durma no ponto
Esteja sempre atento e alerta
O mal tomou todo o café do Cosmos e por isso nunca dorme

Viva a mil
Pois quem vive pra valer nunca morre
Viva intensamente
Sem medo de ter medo
Viva pra valer, bote pra foder
Mas nunca baixe a guarda
O mal, como uma vizinha fofoqueira, sempre está à espreita

Iluminar o mundo custa caro
Um preço que só os que lutam para iluminá-lo, pagam
Trabalhe pelo bem
Viva pelo bem
Faça o bem
Mas nunca esqueça do mal, que igual aos juros bancários, não cessa

A vida é grandiosa
Mas não perdoa ninguém
Nem mesmo os que dizem 'amar a vida'

Nunca esqueça que diante da Imensidão Cósmica Interestelar, ainda somos como meras partículas de poeira cósmica pensantes
No máximo animais pensantes, um dia talvez, espíritos filosofantes

O desapego é maior e melhor que o apego
Por isso não é para qualquer um
Não se deslumbre com nada
A sorte demora e quando chega é fugaz
Mas o azar se delonga como a visita imprópria que parece que nunca vai embora
Não se deslumbre com nenhuma grandeza
Pois toda grandeza é efêmera

A humanidade se acha grande coisa
Os dinossauros eram gigantescos
Mas bastou uma pedra para eles serem varridos da face da Terra

A vida é maravilhosa
Mas não é um conto de fadas
Ou um filme de Hollywood
A realidade quase sempre é outra
Nesse mundo, "onde os fracos não têm vez"
Na maioria das vezes, prevalece a moral do mais forte
Por isso dizem que "o mundo é dos vivos"
Esse mundo tem seu lado belo, é inegável
Mas esse mundo é um mundo cão

A vida é belíssima
Mas não esqueça
Todos nós temos data de validade
Um dia, quando menos esperarmos, do nada, o nosso fim chegará
E tudo o que já fomos, somos e que gostaríamos de ser Estará acabado
Nós sempre seremos pegos
De calças curtas, com calças ou sem calças

Aproveite a vida com tudo o que você puder
Faça tudo o que quiser
Porque o nosso tempo aqui
Cedo ou tarde, acabará
Todos que amamos e tudo o que amamos será destruído pela morte impiedosa
Mas não se aflija
Não retroceda
Não fuja

Enfrenta o que puder ser enfrentado
Aceite o que tiver que ser aceito
Nunca se dê por vencido, por mais ferrado que esteja
Alguns dizem: 'somos, ao mesmo tempo, Luz e Escuridão'
Muitos escolhem ser só escuridão
Mas você pode escolher ser um Viajante da Luz na Escuridão
A vida é incomensurável
É choque de forças
Alternância, mudança, transcendência, transformação
Uns buscam se transformar para o Bem e outros para o Mal

O medo e o ódio podem tomar conta de mentes,
corações e almas por um longo tempo
Mas O Amor é A Lei Transformadora da Vida
Em toda a Incomensurabilidade Cósmica
Em todos os Universos e mundos possíveis

Só duas coisas prevalecem em toda a Incomensurabilidade Cósmica: O Equilíbrio e a Evolução

A vida sempre poderá ser ressignificada
Sempre haverá um ponto de virada
Para mudar, transcender, evoluir
Ser melhor
Pior
Ou ficar na mesma
É a escolha de cada um

A nossa vida aqui na Terra é construção, destruição, reconstrução, ressignificação

Viva de coração, corpo, alma e mente
Viva com tudo
Com força
Com emoção
Com Gratidão
Com fúria
Com Amor
Com imaginação
Com tesão
Com loucura
Com energia
Viva para sempre!

__________Emerson Rodrigues

E. E-Kan



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