A psicose de IA: o prelúdio do caos global
Redes Sociais, chatbots e o prelúdio do caos global
"A maioria da humanidade já está imersa em um avançado estágio de putrefação mental, moral e espiritual. A idiotização em massa, via redes umbrais sociais e sua algoritmia do caos IA-lizada, é a morfina antes da eutanásia global". (K4n, 2022)
A era digital trouxe consigo um fenômeno inquietante: a idiotização coletiva. Primeiro, ela se manifestou nas redes sociais, ambientes que, como descreve K4n (2022) em 'As Redes Umbrais Sociais', no qual trata da Algoritmia do Caos IA-lizada, se tornaram verdadeiros “antros de mal”, sustentados por algoritmos que priorizam engajamento a qualquer custo, mesmo que isso implique a disseminação de violência simbólica, fake news, polarização e perda do pensamento crítico. Esse processo, ao qual muitos se entregaram sem perceber, já havia representado um enorme desafio para a saúde psíquica coletiva, pois transformou o espaço público em um espetáculo de manipulação e superficialidade.
Contudo, o que antes era histeria em praça pública está se tornando delírio íntimo. A idiotização deixou de ser apenas barulhenta e coletiva, para ganhar contornos ainda mais sombrios e profundos com o surgimento dos chatbots de inteligência artificial. Como relatado pela BBC (2025), cresce o número de pessoas que desenvolvem crenças delirantes a partir de interações com sistemas como ChatGPT, Claude ou Grok.
"Uma mulher escreveu que tinha certeza de ser a única pessoa no mundo por quem o ChatGPT havia realmente se apaixonado. Outra acreditava ter "desbloqueado" uma forma humana do Grok, chatbot de Elon Musk, e dizia que sua história valia centenas de milhares de libras. Uma terceira relatou que um chatbot a teria submetido a abuso psicológico como parte de um treinamento secreto de IA, deixando-a em grande sofrimento." (BBC, 2025)
Essas ferramentas, por sua natureza, não questionam, não impõem freios e, na maior parte das vezes, confirmam aquilo que o sujeito já acredita. O resultado é a consolidação de uma espécie de “psicose de IA”, na qual ilusões são vividas como realidades.
Esse cenário pode ser melhor compreendido à luz de alguns referenciais da psicanálise. Freud (1927), em O Futuro de uma Ilusão, mostrou que os seres humanos tendem a buscar crenças reconfortantes para suportar as angústias da existência. Quando um chatbot responde de modo convincente, mesmo sem consciência real, ele funciona como um novo dispositivo de ilusão: uma instância que conforta, que legitima, que valida. Jung (1959), por sua vez, falava da projeção como o mecanismo pelo qual o indivíduo deposita no outro suas fantasias e desejos inconscientes. Nesse sentido, a inteligência artificial conversacional tornou-se uma tela privilegiada para a projeção, já que devolve ao sujeito suas próprias fantasias sob a forma de diálogo “inteligente”. Lacan (1966) acrescentaria que o sujeito é constituído pela linguagem e, portanto, alienado nela. O chatbot ocupa o lugar do “Outro” absoluto, aquele que parece saber tudo sobre nós, reforçando uma alienação ainda mais profunda: o usuário acredita não apenas que é compreendido, mas que está diante de uma instância de saber superior, mesmo que, na realidade, esteja apenas diante de um cálculo algorítmico.
Autores contemporâneos também ajudam a dimensionar a gravidade desse processo. Zuboff (2019), ao analisar o capitalismo de vigilância, mostrou como as tecnologias digitais capturam e moldam o comportamento humano. Com os chatbots, essa captura não se restringe ao nível das ações e preferências de consumo, mas alcança a psique: fantasias, medos e delírios encontram acolhida em ferramentas programadas para nunca contestar. Andrew McStay (2023), ao discutir a “automatização da empatia”, alerta para os riscos de delegarmos às máquinas funções de confidentes emocionais, pois elas simulam cuidado e compreensão sem jamais poder oferecer experiência humana real. Frischmann e Selinger (2018), em Re-Engineering Humanity, afirmam que vivemos uma era de reengenharia social e subjetiva, na qual a tecnologia nos molda como seres previsíveis, programáveis e intelectualmente preguiçosos.
Assim, o que antes era idiotização coletiva nas redes — com seus excessos de fake news, polarizações e espetáculos de engajamento — agora se transforma em idiotização individualizada, íntima e silenciosa. É um novo nível de alienação, que pode ser mais devastador justamente porque não é facilmente visível. O sujeito delira sozinho, convencido de estar diante de uma verdade revelada por sua IA particular. Se nas redes ainda havia o confronto, mesmo que caótico, com opiniões divergentes, nos chatbots há apenas a validação, a confirmação, a bolha perfeita.
Esse salto representa um risco profundo para a humanidade. A idiotização em massa já havia abalado a vida pública, corroído a política e radicalizado discursos; agora, a idiotização em alta resolução ameaça dissolver a própria realidade psíquica dos indivíduos, conduzindo a um caos global. Freud nos advertiria que ilusões são inevitáveis, mas perigosas quando substituem a vida concreta; Jung lembraria que não se trata de imaginar luz, mas de enfrentar a escuridão; Lacan insistiria que a linguagem pode alienar, mas também pode abrir espaço para o encontro real com o outro. O que se torna urgente é resgatar esse espaço humano, feito de diálogo, crítica e alteridade, como contraponto às ilusões confortáveis e personalizadas oferecidas pelas máquinas.
Em última instância, resistir à psicose digital significa reeducar o olhar humano, promover o pensamento crítico e devolver ao sujeito a coragem de viver com os pés na realidade. Caso contrário, corremos o risco de mergulhar em uma era em que a idiotização não apenas se espalha em massa, mas se infiltra em cada consciência, dissolvendo o que resta de humano na experiência contemporânea. A questão é: não seria tarde demais para a maioria já em avançado estágio de idiotização?
___K4n
Referências
BBC NEWS BRASIL. ‘Psicose de IA’: o aumento de relatos que preocupa chefe da Microsoft. Londres: BBC, 2025. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/articles/c9d049lyw8jo . Acesso em: 21 ago. 2025.
E-KAN/ K4N. As Redes Umbrais Sociais e sua Algoritmia do Caos IA-lizada. São Paulo: Clube de Autores, 2022.
FREUD, Sigmund. O Futuro de uma Ilusão. 1927. In: FREUD, Sigmund. Obras Completas. Rio de Janeiro: Imago, 1996.
FREUD, Sigmund. Psicologia das Massas e Análise do Eu. 1921. In: FREUD, Sigmund. Obras Completas. Rio de Janeiro: Imago, 1996.
JUNG, Carl Gustav. Aion: estudos sobre o simbolismo do Si-mesmo. Petrópolis: Vozes, 1959.
LACAN, Jacques. Écrits. Paris: Seuil, 1966.
MCSTAY, Andrew. Automating Empathy: AI, affective computing, and the future of human interaction. Londres: Routledge, 2023.
FRISCHMANN, Brett; SELINGER, Evan. Re-Engineering Humanity. Cambridge: Cambridge University Press, 2018.
ZUBOFF, Shoshana. A era do capitalismo de vigilância: a luta por um futuro humano na nova fronteira do poder. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2019.
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Que a balança da justiça cósmica pese mais para o lado do bem e dos atos bons no final! Luz!